BRASÍLIA/DF - Mais da metade de toda a área desmatada no Brasil em 2023 está localizada no Cerrado, apontou o Relatório Anual do Desmatamento (RAD) do MapBiomas, divulgado na terça-feira (28). Pela primeira vez desde o início da série histórica, em 2019, o Cerrado ultrapassou a Amazônia em termos de área desmatada. Quase todo o desmatamento do país (97%), nos últimos cinco anos, teve a expansão agropecuária como vetor, destacou o relatório.
O levantamento mostrou que, nos últimos cinco anos, o Brasil perdeu 8.558.237 hectares de vegetação nativa, o equivalente a duas vezes o estado do Rio de Janeiro. No entanto, em 2023, houve uma queda de 11,6% na área desmatada: ao todo, 1.829.597 hectares de vegetação nativa foram suprimidos em 2023. Em 2022, esse total foi de 2.069.695 hectares. Essa redução se deu apesar de um aumento de 8,7% no número de alertas, na mesma comparação.
O MapBiomas ressalta que os dados apontam a primeira queda do desmatamento no Brasil desde 2019, quando se iniciou a publicação do RAD. Por outro lado, a avaliação é de que a cara do desmatamento está mudando, se concentrando nos biomas onde predominam formações savânicas e campestres e diminuindo nas formações florestais.
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Em 2023, 61% da área desmatada em todo o país estava no Cerrado e 25% na Amazônia. Foram 1.110.326 hectares desmatados no Cerrado, no ano passado, um crescimento de 68% em relação a 2022. Na Amazônia, a área de vegetação suprimida no ano passado foi de 454,3 mil hectares – uma queda de 62,2% em relação a 2022.
Com exceção do Piauí, São Paulo e Paraná, todos os outros estados que concentram o Cerrado registraram aumento do desmatamento em 2023 na comparação com 2022. No caso do Maranhão, Tocantins, Goiás, Pará e Distrito Federal, a área desmatada mais do que dobrou.
Coordenadora do MapBiomas Cerrado, Ane Alencar lembra que o Cerrado – que já perdeu mais da metade de sua vegetação nativa –, passou a ser o protagonista do desmatamento no país, o que desperta preocupação:
“O Cerrado é um bioma estratégico no que diz respeito à questão hidrológica e o desmatamento do bioma tem um impacto grande na questão hídrica. Várias bacias que nascem no Cerrado banham outros biomas, então, nesse sentido, o desmatamento e a perda do Cerrado representa um impacto para os outros biomas.”
Em 2023, a área média desmatada por dia no país foi de 5.013 hectares ou 228 hectares por hora. Mais da metade foi no Cerrado, onde foram suprimidos 3.042 hectares de vegetação nativa por dia. O resultado é mais que o dobro da área desmatada na Amazônia, 1.245 hectares por dia, que, ainda assim, equivale a cerca de 8 árvores por segundo.
O dia com maior área desmatada em todo o país, no ano passado, foi 15 de fevereiro, quando a estimativa é que uma área equivalente a quase seis mil campos de futebol foi desmatada em apenas 24 horas.
Os dois maiores biomas do Brasil – Amazônia e Cerrado – somaram mais de 85% da área total desmatada no país. Apenas quatro estados com Cerrado, que formam a região conhecida como Matopiba (Maranhão, Tocantins, Piauí e Bahia), ultrapassaram a área desmatada nos estados da Amazônia e responderam por quase metade (47%) de toda a perda de vegetação nativa no país no ano passado. Dos quatro estados do Matopiba, apenas no Piauí teve redução da área desmatada, enquanto nos demais houve crescimento.
Em 2023, o Matopiba perdeu 858.952 hectares de vegetação nativa, o que significa um aumento de 59% em relação ao ano de 2022, o qual já havia registrado aumento (36%) em relação a 2021. Segundo o relatório, três em cada quatro hectares desmatados no Cerrado em 2023 (74%) foram no Matopiba.
Dois terços (33) dos 50 municípios que mais desmataram no Brasil em 2023 ficam no Cerrado, sendo que os 10 municípios com maior área desmatada no Cerrado em 2023 estão todos localizados no Matopiba, apontou o levantamento.
“O combate ao desmatamento no Cerrado exige uma abordagem multifacetada. Primeiro, é essencial distinguir claramente o que é legal e ilegal, para que as ações de fiscalização possam efetivamente inibir o desmatamento ilegal. Ao mesmo tempo, devemos oferecer incentivos para o melhor aproveitamento das áreas já desmatadas, reduzindo assim a pressão sobre novas áreas e reduzindo portanto o desmatamento legal.”
Ela avalia que o aumento do desmatamento no Cerrado parece ser o resultado de uma percepção de que tudo pode ser legalizável no bioma. “Temos que entender que não é porque a reserva legal é menor no Cerrado que todo o desmatamento vai ser legal. Na realidade, precisamos sim ter claramente o número da ilegalidade para que as ações de comando e controle possam ser efetivas, assim como as ações de desestímulo à abertura de novas áreas também”.
Pela primeira vez, o estado do Maranhão saiu da quinta para a primeira posição em área total suprimida, com 331.225 hectares desmatados – aumento de 95,1% em relação ao ano passado. A Bahia ficou em segundo lugar, com 290.606 hectares suprimidos e crescimento de 27,5%. O terceiro estado no ranking foi o Tocantins, com 230.253 hectares desmatados e aumento percentual de 177,9%, em relação a 2022.
O ranking dos cinco estados com maior área desmatada no Brasil inclui ainda dois líderes históricos: Pará e Mato Grosso. No entanto, ambos registraram queda em 2023 – de 60,3% e de 32,1%, respectivamente. A supressão de vegetação nativa em território paraense foi de 184.763 hectares; no Mato Grosso, 161.381 hectares.
“Essa mudança se refletiu também no tipo de vegetação suprimida. Em 2023, pela primeira vez, houve o predomínio de desmatamento em formações savânicas (54,8%) seguido de formações florestais (38,5%) que predominaram nos quatro primeiros anos do levantamento”, destacou a entidade.
O MapBiomas ressalta que a liderança do Cerrado em área de desmatamento no ano passado se reflete em outros indicadores. O maior alerta de desmatamento do Brasil aconteceu no Cerrado, com área de 6.691 hectares, no município do Alto Parnaíba (MA). No bioma, foi detectado ainda o alerta de maior velocidade média diária de desmatamento, sendo 944 hectares em 8 dias, no município de Baixa Grande do Ribeiro (PI).
São Desidério (BA), cujo principal bioma também é o Cerrado, lidera o ranking dos municípios que mais desmataram no país em 2023, com 40.052 hectares. No ano passado, 70% dos municípios do Cerrado registraram pelo menos um evento de desmatamento.
“É no Cerrado que fica a terra indígena (TI) com maior área desmatada no país no ano passado: Porquinhos dos Canela-Apãnjekra, com cerca de 2.750 hectares [suprimidos]. Ao todo, foram perdidos 7.048 hectares de vegetação nativa em TIs no Cerrado, um aumento de 188% em relação a 2022. Em todo o Brasil, ao contrário, houve queda no desmatamento em TIs”, divulgou a entidade.
Em 2023, 20.822 hectares de vegetação nativa dentro de terras indígenas foram desmatados, o que representa 1,1% de todo o desmatamento no ano. Houve uma redução de mais de 27% no desmatamento em TIs, na comparação com 2022.
Dentro de unidades de conservação (UCs), foram 96.761 hectares de vegetação nativa suprimidos em 2023, uma redução de 53,5% em relação a 2022. Em UCs de Proteção Integral, a redução foi de 72,3%. A maior perda de vegetação nativa em UCs ocorreu em Área de Proteção Ambiental (APA) Estaduais no Cerrado, totalizando 41.934 hectares desmatados. A APA mais desmatada no país em 2023 também fica no Cerrado: APA do Rio Preto, com 13.596 hectares desmatados.
Ainda de acordo com o MapBiomas, apesar de apenas 0,96% dos imóveis cadastrados no Cadastro Ambiental Rural (CAR) terem registro de desmatamento em 2023, eles responderam por 89% das áreas desmatadas do país. Do total de 71.689 imóveis cadastrados no CAR com desmatamento validado em 2023, 43,1% foram reincidentes, ou seja, já tiveram registro de desmatamento em anos anteriores.
Para estimar o quanto do desmatamento no Brasil não tem indícios de irregularidade ou de ilegalidade, a entidade explica que cada alerta é avaliado considerando alguns critérios como se há autorização cadastrada nas bases de dados oficiais, ou se há sobreposição com áreas protegidas, como Unidade de Conservação de Proteção Integral, Reserva Legal ou Área de Preservação Permanente.
O relatório anual de desmatamento identificou que 4,04% de toda a vegetação suprimida nos últimos cinco anos não tem indícios de ilegalidade ou irregularidade, considerando autorizações dos estados que disponibilizaram dados publicamente. Para o ano de 2023, mais de 93% da área desmatada no Brasil teve pelo menos um indício de irregularidade.
A redução (62,2%) no desmatamento no bioma Amazônia aconteceu em todos os estados, exceto no Amapá, onde houve crescimento de 27%. Na região de Amacro, que reúne os estados do Amazonas, Acre e Rondônia, e que já foi considerada a principal frente de desmatamento do Brasil, houve queda de 74% na área desmatada, que ficou em 102.956 hectares em 2023.
Dos 559 municípios do bioma, 436 tiveram algum desmatamento detectado em 2023, ou seja, 78% do total. Nos 10 municípios que mais desmataram na Amazônia houve queda. Dos 50 municípios que mais perderam vegetação nativa em 2023, 13 estão presentes na lista de municípios do bioma Amazônia considerados prioritários (Portaria GM/MMA 834 de 2023) e todos eles apresentaram queda na área desmatada em relação a 2022.
“Houve redução no tamanho médio dos alertas e na área desmatada na maioria dos estados, incluindo a crítica região do Amacro. Por outro lado, observa-se um possível deslocamento deste desmatamento, que está crescendo em outros biomas, particularmente no Cerrado, que apresentou a maior área desmatada no Brasil em 2023”, apontou Larissa Amorim, da equipe de Amazônia do MapBiomas, em nota.
Em 2023 o Pantanal registrou a maior área média dos eventos de desmatamento entre os biomas (158,2 hectares) e um aumento de 59,2% no desmatamento em relação a 2022. Ao todo, 49.673 hectares de vegetação nativa foram suprimidos no ano passado. Pelo terceiro ano consecutivo, o bioma apresentou a maior velocidade média de desmatamento, sendo 2,1 hectares/dia por evento de desmatamento.
Formações florestais e savânicas respondem por 73% do desmatamento no bioma. Quase todo (99%) o desmatamento no bioma está em áreas privadas registradas no Cadastro Ambiental Rural (CAR).
“O município de Corumbá (MS) responde por 60% do território do Pantanal e por metade do desmatamento registrado no bioma no ano passado. É também o quinto município que mais desmatou no Brasil em 2023. Mais da metade (52%) do desmatamento do Mato Grosso do Sul está no Pantanal, bioma que representa menos de um terço do território do estado”, destacou o MapBiomas.
Além de eventos extremos de seca no bioma, a entidade avalia que o desmatamento tem sido uma grande ameaça ao Pantanal. “O desmatamento de florestas e savanas para a formação de pastagem exótica acontece em grande escala. A preservação dessas áreas florestadas e o manejo das pastagens são fundamentais para a manutenção da biodiversidade de fauna e flora, em conjunto com os sistemas tradicionais de pecuária do Pantanal”, pontuou Eduardo Rosa, coordenador da equipe do Pantanal do MapBiomas, em nota.
Mais de um quinto (22%) dos alertas validados em todo o Brasil no ano passado vieram da Caatinga, que respondeu por 11% da área desmatada no país. Foram 201.687 hectares, um aumento de 43,3% em relação a 2022. Houve registro de pelo menos um evento de desmatamento em 1.047 dos 1.209 municípios (87%) que compõem o bioma, em 2023.
A Bahia lidera o desmatamento, com 93.437 hectares, o que representa aumento de 34% em relação a 2022. Em seguida, vem o Ceará, com 32.486 hectares – crescimento de 28%. O maior aumento percentual foi registrado no Rio Grande do Norte: 62% (total de 9.133 hectares). Em apenas um estado houve redução na supressão de vegetação nativa: Pernambuco, com 15.996 hectares, ou seja, queda de 35% em relação a 2022.
“O maior desmatamento verificado na Caatinga foi impulsionado pela expansão de atividades agropecuárias, principalmente na fronteira agrícola do Matopiba. Um exemplo é o município de Barra, na Bahia, onde há registro do maior desmatamento e alerta no bioma. Um fenômeno que capturamos é o desmatamento para fins de implantação de parques solares e eólicos crescendo pelo bioma”, explicou Washington Rocha, coordenador da equipe da Caatinga do MapBiomas, em nota. Mais de 4.302 hectares foram desmatados por empreendimentos de energia renováveis (eólica e solar).
No ano passado, 12.094 hectares de Mata Atlântica foram desmatados, uma queda de 59% em relação a 2022. A redução ocorreu em todos os estados do bioma, tanto em área desmatada quanto em número de alertas. No bioma, Minas Gerais reduziu a área desmatada em 60%, ou seja, mais de 7 mil hectares; na Bahia, a queda foi de 53%; no Paraná, foi de 71%. Apesar disso, dos 10 municípios que mais desmataram, os dois primeiros ficam na Bahia e os oito restantes em Minas Gerais.
A média de área desmatada por dia e a média de eventos de desmatamento caíram mais de 50% em relação a 2022. As maiores reduções proporcionais foram observadas nos alertas de mais de 100 hectares, com 88% menos área desmatada se comparado a 2022 e 90% menos eventos de desmatamento.
“A agropecuária ainda é o principal vetor de desmatamento na Mata Atlântica, além da expansão das cidades. Em 2023, observamos áreas devastadas por desastres naturais causados pelas chuvas em São Paulo e por mineração em Minas Gerais”, observou Natalia Crusco, coordenadora técnica da equipe da Mata Atlântica do MapBiomas, em nota.
O Pampa registrou queda de 50% na área de vegetação suprimida em 2023, com 1.547 hectares. Dos 231 municípios do bioma, 97 tiveram algum desmatamento detectado no ano, ou seja, 42% do total. Em apenas cinco deles aconteceu mais da metade (51%) do total desmatado no bioma: Encruzilhada do Sul (334 hectares), Piratini (208 hectares), Herval (130 hectares), Canguçu (77 hectares) e Bagé (49 hectares).
Levantamento do MapBiomas identificou que mais de três quartos (77,7%) da área desmatada é de formações florestais; e um pouco menos de um terço (21,9%), de formação campestre. A entidade pondera, no entanto, que os atuais sistemas de detecção do desmatamento no Pampa estão calibrados para a supressão das florestas e, por conta disso, ainda não monitoram a supressão da vegetação campestre de modo eficiente, que é a vegetação nativa típica e predominante nesse bioma.
Por Camila Boehm – Repórter da Agência Brasil
BRASÍLIA/DF - A preocupação com o avanço do desmatamento no Cerrado, na contramão do que acontece na Amazônia, mobilizou a criação de uma força-tarefa do governo federal com sete estados, mais o Distrito Federal, que detêm porções do segundo maior bioma brasileiro, que ocupa 25% do território nacional. A inciativa é parte dos desdobramentos do Plano de Ação Contra o Desmatamento do Cerrado (PPCerrado), que foi retomado no ano passado.
Uma reunião no Palácio do Planalto, coordenada pelo ministro-chefe da Casa Civil, Rui Costa, na quarta-feira (27), contou com a participação dos governadores Carlos Brandão (Maranhão), Romeu Zema (Minas Gerais), Ronaldo Caiado (Goiás), Mauro Mendes (Mato Grosso), Eduardo Riedel (Mato Grosso do Sul), Wanderlei Barbosa (Tocantins), da vice-governadora do Distrito Federal, Celina Leão; e do secretário de Meio Ambiente da Bahia, Eduardo Sodré.
Também participaram da agenda os ministros Agricultura e Pecuária, Carlos Fávaro; a ministra do Meio Ambiente e Mudança do Clima, Marina Silva; a ministra do Planejamento e Orçamento, Simone Tebet; e a ministra da Ciência, Tecnologia e Inovação, Luciana Santos.
"Na Amazônia, o governo federal tem um poder de ação muito maior. No Cerrado, são os estados que têm um poder de ação maior", afirmou a ministra Marina Silva a jornalistas, após o encontro. "A grande participação de governadores é uma demonstração de que o problema será resolvido, em um pacto que envolve o governo federal, os governos estaduais, envolve o setor produtivo, a sociedade civil e a comunidade científica", acrescentou.
Além da criação de uma força-tarefa com a participação direta dos próprios governadores, as ações propostas incluem um trabalho de unificação das bases de dados dos estados com o governo federal.
A ideia é retomar a alimentação do Cadastro Ambiental Rural (CAR), que foi enfraquecido no governo anterior, levando os estados a desenvolverem suas próprias plataformas de acompanhamento da situação dos imóveis rurais, segundo o governo federal. Além da unificação e cruzamento de informações, de acordo com a Casa Civil, um grupo de trabalho entre ministros e governadores se reunirá periodicamente para acompanhar os dados e tomar decisões.
Fonte de 40% da água doce do país, o Cerrado teve um aumento de 19% nos alertas de desmatamento no mês passado, na comparação com fevereiro de 2023. O bioma perdeu 3.798 quilômetros quadrados (km²) de vegetação nativa, no acumulado de agosto de 2023 a fevereiro deste ano, de acordo com o monitoramento feito pelo Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe). A situação é mais grave e preocupante na região dos estados do Maranhão, de Tocantins, do Piauí e da Bahia - área conhecida pela sigla Matopiba, apontada como a nova fronteira agrícola do país. Quase 75% do desmatamento no Cerrado ocorre nesses quatro estados. Dos 52 municípios responsáveis por metade dos desmatamentos, 50 deles estão no Matopiba.
Durante a reunião, o Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima fez um alerta sobre os impactos de décadas de degradação do solo com desmatamento, além dos efeitos das mudanças climáticas.
"Estamos observando uma mudança no regime de chuvas, sobretudo naquela região ali do Matopiba, uma diminuição no volume de água dos rios, na vazão dos rios, algo em torno de 19 mil metros cúbicos por segundo (m³/s) e outros problemas que podem criar graves situações em relação aos processos econômicos para a agricultura familiar, para o agronegócio", destacou Marina Silva. A ministra também falou sobre um processo sem precedentes de desertificação de áreas próximas ao Cerrado.
A pasta do Meio Ambiente informou que o apoio dos estados na força-tarefa pode garantir a liberação de recursos do Fundo Amazônia para financiar ações, considerando que até 20% dos recursos podem ser aplicados em medida de monitoramento e controle em outros biomas.
Por Pedro Rafael Vilela - Repórter da Agência Brasil
PORTO VELHO/ RO - A substituição de floresta por pastagens e lavouras está afetando diretamente os peixes da Amazônia. Em estudo publicado na revista Neotropical Ichthyology, pesquisadores do Brasil, da Colômbia e dos Estados Unidos mostraram que um processo semelhante ao ocorrido ao longo de décadas em áreas com longa história de desmatamento, como o Estado de São Paulo, se repete agora em Rondônia, no chamado Arco do Desmatamento, onde a derrubada da mata é recente.
Peixes sensíveis a alterações no ambiente estão sendo paulatinamente substituídos por poucas espécies mais resistentes aos impactos. Além da perda de biodiversidade, o fenômeno acarreta uma perda de funções ecológicas exercidas pelos peixes que desaparecem.
“Existe uma hipótese dentro da ecologia de que os vertebrados terrestres suportariam até 60% de perda de hábitat antes de entrar em processo de declínio populacional e, em seguida, de extinção local. Estudando peixes de riachos, verificamos que parte das espécies suporta apenas 10% de perda de hábitat e suas populações começam a declinar em menos de dez anos após o início do desmatamento. Outras, porém, são beneficiadas com perdas de mais de 70% do hábitat”, conta Gabriel Brejão, primeiro autor do estudo, que foi conduzido durante um estágio de pós-doutorado no Instituto de Biociências, Letras e Ciências Exatas da Universidade Estadual Paulista (Ibilce-Unesp), em São José do Rio Preto.
Os resultados são baseados em dados coletados em 75 riachos com diferentes graus de preservação na bacia do rio Machado, um dos tributários do Madeira. Para avaliar o histórico de desmatamento das áreas, os pesquisadores consultaram imagens de satélite da região feitas entre 1984 e 2011.
“A partir dos dados históricos, separamos as áreas em bacias que nunca passaram por mudança, as que sofreram desmatamento há muito tempo e as de degradação recente. Observamos que, onde o desmatamento é recente, a taxa de substituição de espécies (mais sensíveis por mais resistentes) era mais alta do que nas áreas florestadas e nas de desflorestamento antigo”, explica.
Parte das coletas e análises do trabalho foi realizada pelo pesquisador ainda durante o doutorado, na mesma instituição, com bolsa da Fapesp.
O trabalho é um dos resultados do projeto “Peixes de riachos de terra firme da Bacia do Rio Machado, RO”, financiado pela Fapesp e coordenado por Lilian Casatti, professora do Ibilce-Unesp.
A investigação também foi apoiada por meio de projeto coordenado por Silvio Ferraz, professor da Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz da Universidade de São Paulo (Esalq-USP) e coautor do artigo.
Oeste paulista e oeste amazônico
Casatti conta que seu grupo sempre trabalhou com peixes de riachos no Estado de São Paulo, que tem um histórico de mais de 200 anos de uso intenso do solo e de substituição da floresta por lavouras e criações de gado.
“Queria saber como seriam os riachos em um lugar não tão alterado, pelo menos não há tanto tempo. Mas quando chegamos a alguns pontos de Rondônia parecia que não tínhamos saído do oeste paulista, tamanho era o assoreamento, o desmatamento das margens, o capim invadindo o meio aquático”, lembra Casatti, que coordenou o estudo.
Os riachos são especialmente sensíveis ao desmatamento. Usados como local de reprodução e berçário de espécies que podem depois migrar para os rios, esses corpos d’água também aportam diferentes nutrientes da floresta para os rios. No que tange às comunidades de peixes que vivem neles, uma floresta degradada traz vários impactos.
Além do assoreamento, que é a deposição de partículas de solo no fundo dos riachos, diminuindo sua profundidade, a diminuição ou retirada da cobertura florestal permite ainda a entrada de mais radiação solar, que aumenta o crescimento de plantas aquáticas indesejáveis para algumas espécies e eleva a temperatura da água.
Menos frutos, folhas e insetos que servem de alimento para os peixes se fazem presentes, além de galhos e troncos que servem de abrigo e até mesmo modulam a acidez da água, outro fator que pode determinar a presença ou ausência de certas espécies e das funções ecológicas que desempenham.
“Ao perder espécies de cascudos que raspam troncos que caem na água, por exemplo, pode-se perder processamento de matéria orgânica. A perda de peixes insetívoros pode aumentar a quantidade de insetos que transmitem doenças. Peixes carnívoros, como traíras e dourados, exercem uma pressão em espécies mais basais que podem se reproduzir descontroladamente sem os predadores. A qualidade do hábitat tem papel muito importante para manter não apenas uma diversidade de espécies, mas de funções ecológicas”, explica Casatti.
“Nossos resultados indicam que nas áreas de desmatamento mais recente há um conjunto de espécies grande o suficiente para reverter a perda de funções. O que não quer dizer que necessariamente vá se repetir em Rondônia o que aconteceu em São Paulo. Talvez seja um sinal de que em processos iniciais de desmatamento exista um ‘tampão’ de diversidade que está retendo a perda de funções. Não sabemos até quando”, conclui Brejão.
O artigo Taxonomic and functional turnover of Amazonian stream fish assemblages is determined by deforestation history and environmental variables at multiple scales pode ser lido no link.
André Julião / ESTADÃO
AMAZÔNIA - Em abril, o desmatamento na Amazônia Legal atingiu seu maior valor na série histórica para o mês nos últimos 10 anos. A divulgação dos dados é do Imazon (Instituto do Homem e Meio Ambiente da Amazônia), com base no SAD (Sistema de Alerta do Desmatamento), que monitora a região por satélite. Somente neste mês, a área total devastada foi de 778 km². As informações são do UOL.
O aumento em relação a abril de 2020 é de 45% no desmatamento. Entre os estados da Amazônia Legal, o Amazonas lidera o ranking de regiões com maior área desmatada. Em seguida vem o Pará com 26%, Mato Grosso com 22%, Rondônia com 16%, Roraima com 5%, Maranhão com 2% e Acre com 1%.
Segundo o Imazon, as florestas degradadas na Amazônia Legal somam 99 km² em abril. O aumento em relação ao mesmo período do ano passado é de 60%.
*Por: ISTOÉ
FRANÇA - O banco francês BNP Paribas, o maior do país europeu, prometeu nesta segunda-feira (15/02) parar de financiar empresas que produzem ou compram carne bovina ou soja cultivadas em terras desmatadas ou convertidas depois de 2008 na Amazônia.
A instituição afirmou ainda que também "incentivará seus clientes a não produzirem ou comprarem carne bovina ou soja em terras desflorestadas ou convertidas [...] posteriormente a 1º de janeiro de 2020" no Cerrado, de acordo com os padrões globais.
Segundo o BNP Paribas, a ausência de um mapeamento exaustivo das terras no Cerrado impede, por enquanto, que o banco vá além desse incentivo.
Além disso, a instituição afirmou que, até 2025, solicitará aos seus clientes a rastreabilidade total dos setores de carne bovina e soja, financiando assim apenas aqueles que adotarem uma estratégia de desmatamento zero.
"Instituições financeiras expostas ao setor agrícola no Brasil devem contribuir para essa luta contra o desmatamento. Esse é o caso do BNP Paribas", disse o banco em comunicado.
Organizações ambientalistas afirmaram que a declaração envia um forte sinal para as empresas que comercializam commodities na região, mas pressionaram por ações mais rápidas e firmes.
"O banco diz que só está pronto para incentivar, e não forçar, as empresas que atuam no Cerrado. [...] As únicas medidas de exclusão imediatas aplicam-se às empresas que continuam a derrubar ou converter terras na Amazônia", criticou a organização não governamental Reclaim Finance.
"Poucas empresas estão, portanto, preocupadas, visto que já existe uma moratória que estipula o fim do desflorestamento relacionado com a soja a partir de 2008 e é amplamente respeitada", completou. A ONG também considerou a meta estipulada para o ano de 2025 "tarde demais".
"O BNP Paribas está dando aos comerciantes mais cinco anos para derrubar florestas impunemente", afirmou, por sua vez, a associação francesa Canopée - Forêts vivantes.
A soja e a carne bovina são dois dos maiores motores do desmatamento no mundo. O crescimento populacional e uma expansão rápida da classe média em países como a China estimularam uma explosão na demanda por soja e um aumento do consumo de carne e laticínios.
Cientistas alertam que a Floresta Amazônica, que se entende por nove países, está se dirigindo para um espiral mortal à medida que o desmatamento acelera. Segundo a ONG Amazon Conservation Association, uma área do tamanho de Israel foi derrubada na Amazônia só em 2020.
Já em relação ao Cerrado, que cobre 20% do território brasileiro, metade do bioma já foi desmatado, o que o torna um dos ecossistemas mais ameaçados do planeta, denunciaram quatro organizações ambientalistas em uma declaração conjunta.
Na semana passada, uma investigação da organização não governamental Global Witness apontou que vários bancos franceses, em particular o BNP Paribas, respondem pelo financiamento de empresas agrícolas responsáveis pelo desmatamento no Brasil.
O banco disse à Global Witness que todos os seus clientes na Amazônia "foram certificados ou envolvidos num processo de certificação" para garantir que as suas práticas eram responsáveis.
No mês passado, o BNP Paribas e outros credores europeus, como o banco holandês ING e o suíço Credit Suisse, se comprometeram a parar de financiar o comércio de petróleo bruto do Equador após pressão de ativistas com o objetivo de proteger a Amazônia.
ek (Reuters, Lusa, AFP, ots)
*Por: DW
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