Médico infectologista foi alvo de tuíte do presidente por não ter revelado quais medicamentos usou para tratar seu quadro de covid-19
Mencionado em um tuíte do presidente Jair Bolsonaro na manhã desta quarta-feira (8), o infectologista David Uip, coordenador do centro de contingência do coronavírus do governo de São Paulo, manifestou-se sobre a publicação durante entrevista coletiva nesta tarde.
Mais cedo, o presidente escreveu na rede social: "Cada vez mais o uso da cloroquina se apresenta como algo eficaz. Dois renomados médicos no Brasil se recusaram a divulgar o que os curou da COVID-19. Seriam questões políticas, já que um pertence à equipe do governador de SP?".
E emendou: "Acredito que eles falem brevemente, pois esse segredo não combina com o Juramento de Hipócrates que fizeram. Que Deus ilumine esses dois profissionais, de modo que revelem para o mundo que existe um promissor remédio no Brasil".
Além de Uip, o outro médico a quem Bolsonaro se referiu é o cardiologista Roberto Kalil FIlho, do Hospital Sírio-Libanês e do InCor (Instituto do Coração do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da USP).
Uip começou sua fala "lamentando" que haja pessoas preocupadas com o tratamento pessoal dele, mas direcionou a crítica ao presidente.
"Presidente, eu respeitei o seu direito de não revelar o seu diagnóstico [Bolsonaro não mostrou seu exame negativo para covid-19], respeite o meu direito de não revelar o meu tratamento. Eu nunca revelei tratamento dos meus pacientes, eu nunca revelei a doenças dos meus pacientes sem ser autorizado. Então, presidente, por favor, me respeite e respeite o meu direito à privacidade."
O governador de São Paulo, João Doria, lembrou que foi o próprio David Uip, em conversa com o ministro da Saúde, Luiz Henrique Mandetta, que sugeriu a distribuição da cloroquina em toda a rede pública.
O infectologista ressaltou que o uso do medicamento depende de prescrição médica, deve ser feito em hospital e com consentimento do paciente.
"Nada mudou, a cloroquina, desde a semana passada, está indicada para pacientes internados, desde que prescrita por médicos, com aceite formal no papel assinado pelo paciente. Temos uma enorme experiencia com cloroquina. Usamos a cloroquina há muitos anos no tratamento da malária. É uma droga importante, com efeitos colaterais não desprezíveis. É um medicamento que deve ser utilizado sob prescrição e observação médica."
Doria disse que os ataques aos médicos partiram "mais uma vez, sob orientação do dito gabinete do ódio, em Brasília", e que objetivam "destruir a reputação de pessoas".
"Não foi nenhum médico no Brasil que afirmou por várias vezes que a gravíssima epidemia do coronavírus era uma 'gripezinha' ou um 'resfriadozinho'. Nenhum brasileiro ouviu isso de um médico, portanto, respeito com os médicos no Brasil."
Roberto Kalil Filho
Logo após os tuítes do presidente, ainda internado, Kalil Filho concedeu uma entrevista à rádio Jovem Pan e admitiu que recebeu o medicamento, junto a outros, mas ressaltou ter uma preocupação, pois como médico e professor universitário, tinha que respeitar a ética médica.
"Tudo o que eu não quero, pela ética médica, é influenciar outros tratamentos. Se eu estou falando para milhares de pessoas e falo que usei cloroquina, todo mundo vai querer inadvertidamente usar cloroquina. Então, essa é uma responsabilidade muito grande."
No entanto, ele disse que na condição de paciente, recebeu a proposta de tratamento da equipe médica que incluía a hidroxicloroquina.
"Aí você vai me perguntar, você melhorou só por causa da hidroxicloroquina? Provavelmente não, porque [foi] uma gama de remédios. Deve ter ajudado? Espero que sim, provavelmente sim."
David Uip ressaltou que é um direito do paciente revelar o tratamento, assim como é um direito manter sigilo.
*Por R7