FRANÇA - O Governo francês divulgou nesta terça-feira (10) a tão aguardada e debatida reforma da Previdência. A principal medida – e um dos pontos mais sensíveis – será a extensão da idade de aposentadoria para 64 anos, contra os 62 atuais. O tema promete provocar intensas manifestações e os principais sindicatos já convocaram os primeiros protestos.
"Sugerimos que aqueles e aquelas que podem, que trabalharem por mais tempo (...) Esta escolha é também a de todos os nossos vizinhos europeus", anunciou a primeira-ministra Elisabeth Borne durante um discurso televisionado. O projeto prevê aumentar a idade mínima para a aposentadoria gradativamente até 2030, até chegar aos 64 anos.
“Sei bem que a mudança do nosso sistema de aposentadorias suscita receios e dúvidas entre os franceses. Queremos responder e convencer a todos”, continuou Borne, defendendo a “ambição de justiça e progresso” do seu governo.
A primeira-ministra também declarou estar pronta para "fazer avançar" a reforma "graças a um debate parlamentar leal e construtivo".
Os oito principais sindicatos de trabalhadores convocaram um primeiro dia de manifestações e greves em 19 de janeiro. Eles contestam esse plano, que vinha sendo prometido pelo presidente Emmanuel Macron desde a campanha para seu primeiro mandato.
“Reforma injusta”
A líder da extrema direita Marine Le Pen reagiu dizendo que quer "barrar" uma "reforma injusta", enquanto o partido radical de esquerda A França Insubmissa denunciou uma "grave regressão social".
“Voltamos ao que os mais velhos já sabiam, ou seja, depois do trabalho é o cemitério”, denunciou o chefe do sindicato CGT, Philippe Martinez. De acordo com o Instituto Francês de Estatística, um quarto dos homens mais pobres já morreu aos 62 anos.
“Se Emmanuel Macron quer fazer desta a mãe das reformas (...), para nós será a mãe das batalhas”, resume Frédéric Souillot, chefe do sindicato Força Operária.
A França passou por uma série de grandes reformas de seus sistemas previdenciários nos últimos 30 anos, quase todas acompanhadas por grandes movimentos sociais, para responder à deterioração financeira de seus fundos e ao envelhecimento da população.
Para cada francês com 65 anos ou mais, existem atualmente 2,6 com idade entre 20 e 64 anos. Mas estes serão apenas 2,25 em 2030 e menos de 2 em 2040, o que põe em risco o chamado modelo de aposentadoria por repartição, em que as contribuições dos ativos pagam as pensões dos aposentados.
Medida impopular
A reforma previdenciária também prevê acelerar a extensão do período contributivo, avançando para 2027 a exigência de 43 anos de contribuições para pensão completa em vez de 2035, informou o comunicado de imprensa do governo. Em contrapartida, a pensão mínima será aumentada para todos os aposentados, atuais ou futuros, anunciou Borne.
A França é um dos países europeus onde a idade legal para a aposentadoria é a mais baixa, sem que os regimes de pensões sejam completamente comparáveis. São 65 anos na Alemanha, Bélgica e Espanha, e 67 na Dinamarca, de acordo com o Centro de Relações Europeias e Internacionais de Seguridade Social, um órgão público francês.
Mas a medida em relação à idade continua altamente impopular. Mais de dois terços dos franceses (68%) são contra o adiamento para 64 anos, de acordo com uma pesquisa do Ifop-Fiducial.
Em Lille, Olivier Rohas, de 41 anos, gestor de projetos de desenvolvimento sustentável, teme que o novo limite de idade “prejudique realmente nossa qualidade de vida”, ainda que “entenda” a necessidade de “financiar as nossas pensões”.
"A partir dos 50 anos é difícil para alguém encontrar trabalho. Então, o que ele fará dos 50 aos 65? Durante 15 anos, ele permanecerá à procura de emprego antes de passar para a aposentadoria", observa Emmanuel, empresário entrevistado pela AFP em Versalhes, na região parisiense.
Coletes amarelos, o retorno
No parlamento, o governo francês espera receber o apoio dos deputados da direita moderada (Os Republicanos), cujo chefe Eric Ciotti já afirmou estar pronto para "votar uma reforma justa".
O texto será apreciado no Conselho de Ministros no dia 23 de janeiro, enquanto a coalizão de esquerda Nupes se reúne nesta terça e 17 de janeiro, e o partido A França Insubmissa, da esquerda radical, já planeja uma manifestação no dia 21. “Acho que temos um bom equilíbrio de poder”, revelou a presidente do partido na Assembleia Nacional, Mathilde Panot.
O projeto de lei deve passar em comissão na Assembleia Nacional a partir de 30 de janeiro e no Parlamento em 6 de fevereiro.
No último sábado (7), os "coletes amarelos" – cujas manifestações semanais por mais de um ano marcaram fortemente o primeiro mandato de Emmanuel Macron – tentaram se remobilizar. Mas apenas 4,7 mil pessoas, incluindo 2 mil em Paris, de acordo com o Ministério do Interior, estiveram presentes nesta primeira manifestação, pontuada por canções hostis ao presidente francês, mas sem a violência que marcou o movimento desde o final de 2018 até o início de 2020.
(Com informações da AFP)
por RFI