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ESPANHA - No próximo domingo (23), a Espanha vai às urnas para eleições legislativas que, segundo as pesquisas, devem devolver o poder à direita e fortalecer o domínio dos partidos conservadores na União Europeia.

Convocadas pelo presidente de governo, o socialista Pedro Sánchez, após a debacle da esquerda nas eleições municipais de 28 de maio, o pleito geral antecipado também pode trazer a extrema direita para o seio do governo pela primeira vez desde a morte do ditador Francisco Franco há meio século.

Uma situação que confirmaria "um processo contínuo e paulatino de normalização da extrema direita a nível europeu", afirmou à AFP o historiador Steven Forti, professor da Universidade Autônoma de Barcelona (UAB).

Assim, muita coisa está em jogo tanto para Sánchez, no poder desde 2018 à frente de uma coalizão minoritária que passou a contar com o partido de esquerda radical Podemos em 2020, como para a esquerda europeia.

"É evidente que existe um movimento de fundo [na Europa] e a Espanha é uma barreira de contenção bastante importante para essa corrente regressiva e reacionária", afirmou em junho ao jornal La Vanguardia a ministra para a Transição Ecológica, Teresa Ribera, em referência a uma possível coalizão de governo entre direita e extrema direita.

 

- O medo do Vox -

Desde as eleições municipais, o triunfo do Partido Popular (PP, conservadores) de Alberto Núñez Feijóo nas legislativas de 23 de julho parece inevitável.

A única dúvida é se haverá necessidade de uma aliança com o Vox, um partido ultranacionalista e ultraconservador nascido em 2013 de uma cisão no PP, para alcançar a maioria absoluta de 176 deputados necessária para formar governo.

A dinâmica da direita perdeu impulso quando o PP foi obrigado a negociar acordos com o Vox para formar governo em algumas regiões que estavam sob controle da esquerda.

Como esperava Sánchez, o PP e seu líder não saíram ilesos dessas negociações, com a rejeição do Vox a falar de "violência de gênero" e sua negação da mudança climática.

Posições extremas que não são as do PP, mas que permitiram a Sánchez fazer campanha pedindo que os eleitores a não votassem nos conservadores porque isso significaria levar o Vox para o governo e causar retrocessos sociais.

Seu objetivo é duplo: dissuadir o eleitor de centro a votar no PP e mobilizar os 500 mil simpatizantes da esquerda que não compareceram às urnas em 28 de maio.

Mas as esperanças escassas de Sánchez de uma "virada" se viram frustradas depois de seu fraco desempenho diante de Feijóo no único debate televisionado entre ambos, em 10 de julho, que levou ao crescimento do PP nas pesquisas.

Sánchez gabou-se de seu desempenho na economia, que é bastante positivo no contexto europeu, com uma Espanha que cresceu 5,5% em 2022 e se tornou, em junho, a primeira grande economia da UE em que a inflação caiu para menos de 2% (1,9%). O problema para ele, no entanto, é que a percepção dos espanhóis sobre a própria situação econômica continua sendo muito negativa.

 

- 'Derrubar o sanchismo' -

O líder socialista também aumentou suas entrevistas em programas de grande audiência que costumava ignorar.

"Sánchez reconhece que errou ao não comparecer nos meios de comunicação que considerava hostis", resumiu a cientista política Cristina Monge.

Mas talvez seja tarde para Sánchez, que conta com uma imagem muito negativa para além da esquerda, e que deteriorou ainda mais com os efeitos devastadores de leis promovidas pelo Podemos.

Isso facilitou a campanha do PP, que popularizou o lema "derrubar o sanchismo". Nas palavras de Núñez Feijóo, isso significa abolir "todas aquelas leis inspiradas nas minorias e que atentam contra as maiorias".

O Podemos, que está em queda livre, resignou-se a ser absorvido por uma nova coalizão de esquerda radical, Sumar (Somar, em português), dirigida pela ministra do Trabalho, a comunista Yolanda Díaz, com quem os socialistas buscam formar uma nova coalizão de governo. Uma hipótese pouco provável com base nas pesquisas, embora a Sumar brigue pelo terceiro lugar com o Vox.

Também pode influir no resultado a data do pleito, em pleno verão europeu, com milhões de espanhóis de férias que, se quiserem votar, terão que fazê-lo por correio.

Os especialistas consideram que é cada vez menos improvável um cenário vivenciado há alguns anos, de um Parlamento sem uma maioria de governo viável, o que levaria a novas eleições nos meses seguintes.

 

 

AFP

BUENOS AIRES - A corrida eleitoral na Argentina está se estreitando em uma disputa de dois concorrentes, antes das eleições primárias de 13 de agosto, com a escolha de um candidato de centro pela coalizão peronista governista neutralizando parte da ameaça do libertário de extrema direita Javier Milei.

As pesquisas mostram os dois principais candidatos do bloco de oposição conservadora, a ex-ministra da Segurança Patricia Bullrich e o prefeito de Buenos Aires Horacio Larreta, logo à frente do candidato da coalizão governista, o ministro da Economia, Sergio Massa.

Isso comprimiu Milei, um economista de extrema direita que prometeu dolarizar a economia e fechar o banco central, buscando explorar a raiva do eleitor com inflação acima de 100%, reservas em moeda estrangeira secando e 40% de pobreza.

"Estamos vendo uma tendência constante, embora gradual, de se tornar uma corrida polarizada entre as duas principais coalizões", disse Marina Acosta, da empresa de pesquisas Analogias.

A pesquisa de 28 a 30 de junho com 2.569 entrevistados mostrou que 32,7% dos eleitores apoiam Bullrich-Larreta juntos, 28,3% apoiam Massa e 4% o candidato peronista Juan Grabois. O partido de Milei tem 17,8%, e 12,7% ainda estão indecisos.

“A parcela de indecisos diminuiu e o espaço ocupado pela ultradireita encolheu”, disse Acosta.

Os mercados e investidores da Argentina saudaram a candidatura de Massa, um pragmático moderado dentro do bloco peronista, o que afastou a facção mais esquerdista da coalizão.

Mas Massa enfrenta uma batalha difícil contra os conservadores nas eleições de outubro, que irão para o segundo turno se nenhum candidato conseguir mais de 50%. O bloco de oposição escolherá entre Bullrich e Larreta nas primárias de agosto.

 

 

Por Nicolás Misculin / REUTERS

BRASÍLIA/DF - Um juiz superpoderoso que concentra em suas mãos processos de grande repercussão e adota decisões controversas a partir de aplicações inovadoras da lei.

Para alguns, a descrição se aplicaria facilmente à atuação do hoje senador Sergio Moro (União Brasil-PR) quando era juiz da Operação Lava Jato, à frente da 13ª Vara de Curitiba.

Para outros, ela define bem o desempenho de Alexandre de Moraes como ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) e presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE).

 

Mas seria correto aplicar a descrição a ambos?

A BBC News Brasil conversou com juristas para entender se o país vive uma espécie de "Lava Jato às avessas", com métodos questionáveis usados na operação — que atingiu em especial o PT e outros partidos da base do governo de Dilma Rousseff — sendo adotados nas Cortes superiores, sob a liderança de Moraes, agora contra o campo bolsonarista e ex-integrantes da própria Lava Jato, como o deputado cassado pelo TSE Deltan Dalagnoll (Podemos-PR), antigo chefe da força-tarefa do Ministério Público Federal em Curitiba.

As avaliações são diversas (confira em detalhes ao longo da reportagem). Em geral, entrevistados apontam algumas semelhanças, em especial na grande concentração de casos importantes no gabinete de um mesmo magistrado, algo que parece desrespeitar o princípio do juiz natural, uma garantia constitucional que busca evitar perseguições com o direcionamento de investigações para determinado promotor ou juiz.

Por outro lado, também enfatizaram diferenças relevantes entre os dois casos, como a relação indevida de parceria entre o Ministério Público Federal e Sergio Moro, que não se repete na atuação da Procuradoria-Geral da República nas investigações sob relatoria de Moraes. Ou a obtenção de acordos de delação premiada após longas prisões preventivas, uma prática comum na Lava Jato que até hoje não foi usada nas investigações contra o ex-presidente Jair Bolsonaro e seus aliados que tramitam no gabinete de Moraes.

Entre semelhanças e diferenças, decisões consideradas questionáveis foram tomadas por ambos. Por exemplo, quando Moro decretou em 2016 a condução coercitiva do então ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, agora de volta ao comando do país. A medida foi tomada mesmo sem uma convocação prévia para o petista depor, o que contrariava frontalmente o texto da lei, segundo especialistas.

Ou, no caso de Moraes, quando decidiu afastar o governador do Distrito Federal (DF), Ibanês Rocha, por 90 dias, após a invasão das sedes dos Três Poderes, no dia 8 de janeiro. A decisão gerou controvérsia porque foi tomada sem pedido da Procuradoria-Geral da República (PGR) e quando Lula já havia determinado a intervenção federal na área de segurança do DF.

 

Muita responsabilidade traz riscos maiores

Para Fábio de Sá e Silva, professor da Universidade de Oklahoma (EUA) e autor de estudos sobre a Lava Jato, as grandes responsabilidades depositadas sobre o então juiz Sergio Moro (o combate à corrupção) e agora sobre Alexandre de Moraes (a defesa da democracia) trazem o risco de decisões controversas ou mesmo fora da lei.

"Tanto o Moro quanto o Alexandre são juízes que estão lidando com questões complexas e que têm uma ampla repercussão na sociedade e na política. Isso aproxima muito os dois. Mas os instrumentos que o juiz tem para interferir na realidade e conseguir enfrentar essas questões complexas são sempre muito limitados, porque o juiz age dentro da lei, ou pelo menos tem que agir", afirma.

"Então, se fica tudo nas costas do juiz, seja enfrentar a corrupção, seja defender a democracia, o risco que existe de fazer um uso não autorizado desses instrumentos é sempre muito grande", ressalta.

O advogado Horácio Neiva, doutor em Filosofia e Teoria Geral do Direito na USP, tem leitura semelhante. Para ele, tanto a atuação da Lava Jato como a de Moraes têm um traço em comum: a instrumentalização do direito na busca de um resultado. Essa instrumentalização, segundo Neiva, consiste em interpretar as leis de forma excepcional para alcançar determinado objetivo.

"No caso da Lava Jato, era a instrumentalização do direito para obter o resultado combate à corrupção. E agora, no caso (de Moraes), tem sido a instrumentalização sob o argumento de proteção à democracia", afirma.

"O excesso de instrumentalização foi o que pegou a Lava Jato, o que permitiu uma reação (à operação). Quando você se afasta da legalidade estrita pontualmente, às vezes consegue justificar, mas quando é sistemático, não. Isso me parece que também é um risco para o Supremo e o TSE. Uma hora a exceção vai ter que parar, sob pena dela virar regra", afirma Neiva.

Para o advogado, a grande concentração de casos nas mãos de Moro e Moraes ilustra bem essa instrumentalização. Embora a lei brasileira preveja que novas investigações que têm conexão com outras em andamento devem ser distribuídas por prevenção ao mesmo juiz, o advogado avalia que têm sido adotadas interpretações forçadas para manter casos distintos no gabinete do ministro, como ocorreu na Lava Jato.

O resultado, nota ele, é o desrespeito a regras previstas em lei que determinam em qual vara um caso será investigado e julgado. Isso vai depender, por exemplo, de qual é o suposto crime, o local que ele teria sido cometido e quem são os suspeitos (se possuem foro especial ou não).

 

Como Moro e Moraes concentraram tantos poderes?

Um fator importante para explicar os "superpoderes" adquiridos pelo então juiz Sergio Moro e agora por Moraes é a grande quantidade de casos com impacto político sob suas responsabilidades, acreditam os juristas entrevistados. Mas como isso aconteceu?

A Operação Lava Jato, iniciada em 2014, sacudiu o país ao atingir, de forma inédita, executivos e políticos poderosos, acusados de desviar recursos públicos da Petrobras e de outras estatais e obras públicas. O preso mais ilustre foi Lula, reeleito presidente após ter suas condenações anuladas pelo Supremo.

Muito celebrada inicialmente, contando com grande apoio popular e respaldo das Cortes Superiores, a operação conseguiu aval do STF para concentrar as investigações que envolviam possíveis desvios da petrolífera na 13ª Vara de Curitiba. Isso deu grandes poderes a Moro, ao colocar em suas mãos o julgamento de supostos crimes cometidos nos mais variados cantos do Brasil.

O argumento era de que todos esses casos teriam relação com um grande esquema de corrupção revelado a partir de desdobramentos de investigações contra organizações criminosas que atuavam no Paraná, envolvendo doleiros, como Alberto Youssef, e o ex-deputado federal do PP José Janene.

Posteriormente, quando a operação perdeu credibilidade com a entrada de Moro no governo de Jair Bolsonaro e o vazamento de diálogos que indicavam uma espécie de conluio entre o então juiz e Dalagnoll, os questionamentos a essa grande concentração de casos em Curitiba ganharam força.

As condenações contra Lula, por exemplo, foram anuladas depois que o STF entendeu que os supostos crimes deveriam ser julgados na Justiça Federal de Brasília, já que não havia evidência suficiente de que ele teria sido beneficiado por empreiteiras com recursos desviados da Petrobras (argumento usado para concentrar os casos em Curitiba), como alegava a força-tarefa da operação.

Depois, essas anulações foram reforçadas em outra decisão do Supremo, que considerou Moro parcial nos processos contra Lula. Os casos acabaram prescrevendo e foram encerrados sem novo julgamento em Brasília.

Como ocorreu na Lava Jato, a grande concentração de investigações nas mãos de Moraes também deu grandes poderes ao ministro e tem provocado questionamentos.

O ministro se tornou relator de inquéritos que investigam os mais diversos crimes relacionados a Jair Bolsonaro e seus aliados: de ataques antidemocráticos aos Três Poderes no 8 de janeiro à suposta tentativa do ex-presidente de incorporar joias doadas à Presidência da República ao seu patrimônio pessoal, passando pela falsificação de certificados de vacina contra covid-19.

As investigações concentradas no gabinete de Moraes tiveram origem no chamado inquérito das Fake News, alvo de controvérsia jurídica já no seu início, por ter sido aberto em 2019 por decisão direta do então presidente do STF, Dias Toffoli. Isso foi feito à revelia da PGR – ou seja, sem a participação do Ministério Público, que é a instituição responsável por investigar e denunciar criminalmente no país, segundo a Constituição Federal.

No entanto, julgamento do STF de junho de 2020 considerou o inquérito legal. A avaliação foi que o Supremo pode abrir investigação quando ataques criminosos forem cometidos contra a própria Corte e seus membros, representando ameaças contra os Poderes instituídos, o Estado de Direito e a democracia.

A partir daí, outros inquéritos foram instaurados, como os que investigam atos antidemocráticos ou a atuação de milícias digitais. Em vez de a relatoria dessas investigações serem sorteadas entre os ministros do STF, elas foram mantidas com Moraes, sob a justificativa de apurarem possíveis crimes relacionados ao inquérito inicial.

O professor de Direito Processual Penal da Universidade Federal Fluminense (UFF) João Pedro Pádua questiona se parte dessas novas investigações deveria ser mantida no Supremo, já que em alguns casos não está claro se há pessoas com foro privilegiado (devido ao sigilo de parte dos inquéritos, nem tudo é de conhecimento público).

Porém, ainda que haja fundamento para o foro no STF, ele defende que seria mais adequado sortear a relatoria entre todos os ministros da Corte nos casos sem forte conexão com os inquéritos que já tramitam no gabinete de Moraes.

"Essa concentração de competência (no gabinete de Moraes) é muito questionável. E, aparentemente, o motivo pelo qual ela (a competência) está sendo mantida é a mesma que levou o STF a manter muitos casos com Moro por anos: é um juiz forte, sem medo de tomar decisões duras, e que está tomando uma posição que, no âmbito da esfera pública, é a posição que está sendo mais valorizada", analisa Pádua.

"No momento, essa posição é a de ser duro com o grupo bolsonarista, com pessoas ligadas à extrema direita. Então, como essa posição é a preferida pela comunidade jurídica, pela comunidade política de modo geral, o Supremo Tribunal Federal mantém, com pouquíssimas dissidências, as competências concentradas em si mesmo, no Supremo, e, dentro dele, na relatoria do ministro Alexandre de Moraes", acrescenta.

Pádua e Horácio Neiva citaram como exemplo o inquérito que investiga a fraude nos certificados de vacinas. Para ambos, essa investigação não parece ter forte conexão com outras que já tramitam no gabinete do ministro.

Foi a partir desse inquérito que Moraes autorizou uma operação que apreendeu o celular de Jair Bolsonaro e prendeu aliados próximos, como Mauro Cid, que foi ajudante de ordens do ex-presidente.

Conforme mostrou reportagem do jornal Folha de S.Paulo, Moraes justificou manter sob sua relatoria essa investigação com o argumento de que a falsificação dos certificados foi usada para manter a coerência da campanha de desinformação contra vacinas da covid-19. Por isso, argumentou o ministro, o caso teria conexão com o inquérito das milícias digitais, do qual é relator e apura a disseminação de notícias falsas nas redes sociais, inclusive sobre os imunizantes.

"Esse caso da vacina é um exemplo bastante elucidativo disso (a manipulação da competência). Porque dizer que falsificar (certificado de) vacina tem a ver com desmerecer a vacina é até engraçado. É exatamente o oposto", critica Pádua.

Para a professora de direito constitucional da Universidade Federal do Paraná (UFPR) Estefânia Barboza, a concentração dos inquéritos no gabinete de Moraes acaba fragilizando o STF.

"Os tribunais existem justamente para serem colegiados. É a colegialidade que dá legitimidade aos tribunais, (que garante a) imparcialidade. Na hora que eu coloco todas as questões que envolvem discussão de crimes na esfera digital, ou relacionados a atentados à democracia ou a fake news com um ministro, eu acho que enfraquece o tribunal como um todo", avalia.

A professora lembra que um dos argumentos que foram usados para justificar a manutenção dos inquéritos com Moraes seria uma suposta omissão de órgãos de investigação, como Polícia Federal e Procuradoria-Geral da República, para apurar os ataques à Corte e suspeitas contra aliados de Bolsonaro durante seu governo. Para Barboza, esse contexto mudou com a troca de presidente.

"Me parece que agora é preciso caminhar para normalidade, não estamos vivendo um estado de exceção. Você tem o Lula como presidente, você tem as instituições funcionando, então não se pode usar das práticas que a gente condenava antes. Não queremos um 'lavajativismo' da esquerda, né?", questiona.

À BBC News Brasil, o jurista Miguel Reale Júnior defendeu que haja uma "uma análise mais detida" sobre a distribuição de novas investigações que eventualmente sejam abertas no STF.

Ele, porém, lembrou que o plenário do Supremo validou a concentração da relatoria dos inquéritos com Moraes e elogiou a atuação da Corte na "defesa da democracia" diante de "fatos gravíssimos".

"Eu critiquei a cassação do Deltan (pelo TSE), mas eu não vejo nenhum 'lavajatismo' ou alguma parcialidade nas decisões que são feitas em defesa da democracia. O papel do Supremo Tribunal Federal foi fundamental", defendeu.

"Quem segurou a democracia no país, durante o governo Bolsonaro, e também diante da omissão da Procuradoria (PGR), foi o Supremo", disse.

Procurado por meio da assessoria do Supremo Tribunal Federal, Moraes não quis se manifestar.

 

Para professor da USP, há grandes diferenças entre Moraes e Moro

Apesar de concordar que a concentração de investigações e processos em um mesmo juiz é "um ponto de crítica semelhante" a Moro e Moraes, o professor de Direito da Universidade de São Paulo (USP) Rafael Mafei vê grandes diferenças entre os dois casos e considera equivocado usar a Lava Jato como parâmetro para supostos erros do ministro.

"Eu fico um pouco preocupado com as pessoas usarem a Lava Jato como o gabarito da crítica porque acho que isso força uma série de comparações que são equivocadas e, às vezes, a gente perde a oportunidade de fazer críticas, e eventualmente, apontar coisas erradas (na atuação de Moraes), mas que não têm nada a ver com a Lava Jato", diz Mafei.

O professor aponta duas diferenças que considera importantes entre os dois casos. A primeira, diz, seria a existência de um "conluio entre juiz e promotor" no caso da operação.

Essa crítica ganhou força quando uma série de reportagens do portal The Intercept Brasil conhecida como Vaza Jato revelou supostos diálogos privados da força-tarefa da operação, inclusive conversas entre Dallagnol e Moro que indicavam uma atuação coordenada entre Ministério Público e o juiz nos processos contra Lula e outros acusados.

"Para mim, (esse conluio) é a grande marca do abuso da Lava Jato. E é completamente inexistente no caso das críticas que podem ser feitas Alexandre de Moraes. Aliás, uma das principais críticas que se faz ao Alexandre de Moraes deriva justamente do fato de que a atuação do Ministério Público Federal foi tudo menos aquilo que ele queria", ressalta.

A segunda grande diferença, na visão de Mafei, seria a presença de um direcionamento político-ideológico apenas na Lava Jato. Para ele, a operação mirou principalmente os partidos da base dos governos de Lula e Dilma – PT, MDB, PP e PL – com objetivo de enfraquecê-los.

Como exemplo, aponta a divulgação da delação do ex-ministro petista Antonio Palloci com graves acusações contra Lula às vésperas da eleição presidencial de 2018, quando o atual ministro da Fazenda, Fernando Haddad (PT), foi derrotado por Bolsonaro. A retirada do sigilo foi determinada por Moro de ofício, ou seja, sem pedido do MPF.

As mensagens hackeadas do celular de Deltan Dallagnol, divulgadas pela Vaza Jato e depois apreendidas pela Polícia Federal na operação "Spoofing", mostraram que a decisão de Moro foi criticada mesmo por procuradores em um grupo de conversa, revelou reportagem do portal Conjur.

"Parece que o Judiciário está tentando, mais uma vez, ser protagonista do processo político. Vejo nesse levantamento do sigilo tentativa de influenciar na eleição presidencial. Espero estar errado", disse, por exemplo, o procurador João Carlos de Carvalho Rocha.

Para Mafei, o fato de as investigações no gabinete de Moraes mirarem principalmente Bolsonaro e seus aliados não se trata de uma perseguição ao grupo, mas de uma reação a ataques que partiram desse campo ao Poder Judiciário.

"Tirando as pessoas que vivem no delírio mais amalucado da interpretação política, não acho que exista qualquer um que ache que o Moraes esteja mancomunado com o PT por afinidade ideológica para dar hegemonia à esquerda", avalia.

"O Moraes é uma pessoa que tem histórico de filiação e de atuação política adversária à esquerda. E os embates que ele teve com o espectro específico de Jair Bolsonaro foram no contexto de uma reação a ataques feitos ao sistema de Justiça, à Justiça Eleitoral e ao Supremo Tribunal Federal", reforça.

Moro e Dallagnol sempre negaram qualquer ilegalidade nas conversas reveladas pela Vaza Jato. Eles criticam a anulação das condenações e destacam os R$ 6,7 bilhões recuperados pela Petrobras de empresas e ex-executivos alvos da Lava Jato como comprovação dos crimes combatidos pela operação.

"Não tem inocente que foi condenado na Lava Jato. Quem foi condenado é porque pagou suborno ou porque recebeu suborno. Você não vai encontrar nada naquelas mensagens (mostradas na Vaza Jato) de alguém que foi incriminado indevidamente", afirmou Moro em entrevista ao UOL no ano passado.

"Ora, a Petrobras recuperou R$ 6 bilhões. Ela mesmo divulgou. Não é uma estimativa. Você teve as pessoas que confessaram os crimes. Você teve as grandes empreiteiras que pagaram indenizações e multas. Os fatos estão lá, eles existiram", disse também na ocasião.

 

Prisões abusivas?

Moraes também tem sido questionado por possível uso abusivo de prisões preventivas com objetivo de forçar delações premiadas, uma crítica comum à Lava Jato.

Até o momento, porém, não há informação pública de que algum acordo de colaboração foi firmado nos inquéritos que tramitam no gabinete do ministro contra o campo bolsonarista.

Um dos casos que levantou esses questionamentos foi o do ex-ministro da Justiça de Bolsonaro, Anderson Torres, que ficou cerca de quatro meses preso por determinação de Moraes. Ele é investigado por suposta omissão nos ataques golpistas de 8 de janeiro, quando as sedes dos Três Poderes foram invadidas e depredadas. Naquele momento, Torres era o secretário de Segurança do Distrito Federal, órgão responsável por proteger os prédios públicos em Brasília.

A decisão inicial pela prisão de Torres foi referendada pela maioria do STF (9 votos a 2), no julgamento que manteve também o afastamento do governador Ibaneis Rocha. Depois, Moraes prorrogou a prisão preventiva sob argumento de que era "adequada para garantia da ordem pública e conveniência da instrução criminal", ou seja, para evitar a repetição dos supostos crimes e não atrapalhar a investigação.

Torres foi solto em maio, sob condições como usar tornozeleira eletrônica, não portar arma de fogo e ficar afastado das redes sociais.

Para aliados de Bolsonaro, a prisão teria objetivo de forçar uma delação premiada que atingisse o ex-presidente. O deputado Eduardo Bolsonaro (PL-SP) chegou a dizer que Torres teria "procurado se suicidar".

"Não há qualquer motivo para a prisão. Anderson Torres já tem um quadro depressivo. (…) A prisão preventiva se enquadra apenas quando existe risco de fuga, que não foi o caso. Anderson Torres, inclusive, retornou ao país (dos Estados Unidos). Ele não está atrapalhando as investigações nem pondo sob risco a ordem econômica ou a ordem pública", disse o deputado ao portal Metrópoles.

Outro aliado próximo de Bolsonaro que segue preso é seu ex-ajudante de ordens Mauro Cid. Alvo de diferentes inquéritos no gabinete de Moraes, ele foi detido preventivamente no início de maio, no caso dos cartões falsos de vacinação, com a justificativa de que poderia atrapalhar as investigações caso estivesse solto.

Autor do livro Prisões Preventivas da Lava Jato – Uma análise empírica e crítica de seus fundamentos, o advogado Álvaro Chaves estudou as prisões determinadas por Moro entre 2014 e 2017 em sua pesquisa de mestrado, na Universidade de Brasília (UnB).

Ressaltando não ter o mesmo conhecimento aprofundado das decisões de Moraes, ele apontou à BBC News Brasil duas diferenças entre as prisões determinadas pelo ministro e as da Lava Jato: a duração e a liberação após a delação premiada.

"Analisando a questão temporal, me parece que não tem nenhum paralelo esse tipo de comparação (entre prisões de Moro e Moraes). Houve prisões na Lava Jato que duraram três anos, dois anos e meio. E o Torres ficou preso quatro meses. Se você pegar uma análise mínima da jurisprudência, eu te desafio a achar (alguma decisão que aponte) excesso de prazo com quatro meses", ressalta.

Na sua pesquisa sobre Lava Jato, Chaves analisou também as decisões em que Moro revogou prisões preventivas. Na metade dos casos estudados, a pessoa foi solta após fechar acordo de delação.

"Fiz uma análise histórica de três anos que, na minha visão, mostra que esse modo de agir é bastante claro. As prisões da Lava Jato tinham, sim, a finalidade de aumentar os acordos de colaboração premiada", avalia o advogado.

"No caso do Torres, ficou preso quatro meses, algo ordinário no Brasil, e o Moraes não soltou ele porque estava negociando delação premiada. Na Lava Jato, teve prisão preventiva que foi revogada por Moro antes da pessoa ser presa, porque a pessoa começou a negociar a delação", disse ainda.

 

A controversa cassação de Deltan

Além de concentrar a relatoria de inquéritos importantes, Moraes acumula mais poderes no momento por ser o presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE).

O comando da Corte é exercido rotativamente por ministros do STF e o mandato de Moraes vai até junho de 2024.

Ele decidirá, por exemplo, quando será julgada uma ação que tem potencial de deixar Jair Bolsonaro inelegível por oito anos, por suspeita de ter cometido falsos ataques ao sistema eleitoral brasileiro. O caso foi liberado no final de maio pelo corregedor da Justiça Eleitoral, o ministro Benedito Gonçalves, que hoje é visto como um aliado de Moraes no TSE. No total, o ex-presidente enfrenta 16 ações que pedem sua inelegibilidade.

Especialistas eleitorais, como a advogada Vânia Aieta, professora da Universidade Estadual do Rio de Janeiro (UERJ), veem risco real do ex-presidente ser condenado, tanto pelos ataques ao sistema eleitoral, como por uso da máquina pública para favorecê-lo na campanha de 2022.

Bolsonaro, por sua vez, nega qualquer irregularidade e diz que as críticas que fez às urnas eletrônicas eram uma preocupação legítima com a segurança da votação.

Enquanto o julgamento mais aguardado do ano não chega, o TSE enfrentou outra ação importante em maio, quando decidiu por unanimidade cassar o mandato de deputado de Dallagnol, com base na Lei da Ficha Limpa. Essa lei estabelece que membros do Ministério Público não podem disputar a eleição caso tenham Processos Administrativos Disciplinares (PADs) pendentes ao deixar o cargo para se candidatar.

Dallagnol não tinha processos abertos quando pediu demissão do MPF, mas enfrentava outros 15 procedimentos preliminares relacionados a supostos abusos quando atuava na Lava Jato que, em tese, poderiam resultar na abertura de novos PADs.

Como o então procurador se demitiu meses antes do prazo para disputar eleição, o TSE entendeu que ele antecipou sua saída para evitar a abertura de um PAD contra si, realizando assim uma fraude ao objetivo da lei da Ficha Limpa de evitar que integrantes do Ministério Público que enfrentem esses processos possam disputar eleição.

A decisão dividiu juristas. Na visão do ex-juiz eleitoral Márlon Reis, considerado o idealizador da Lei da Ficha Limpa, a decisão do TSE foi "irretocável" e seguiu o "espírito da lei" de buscar evitar que autoridades driblem as hipóteses de inelegibilidade.

Já Reale Júnior considerou a decisão arbitrária, ao cassar o mandato de Dallagnol sem que houvesse de fato um PAD aberto contra ele. Na sua visão, a decisão alimenta o discurso do ex-procurador de perseguição aos antigos integrantes da Lava Jato.

"Eu creio que dá fôlego para essa argumentação, e dá fôlego para alimentar esse antagonismo, esse Brasil como um rio fora do leito, espalhando e disseminando controvérsias e ódios. Então não facilita de forma nenhuma a união", criticou.

"Eu acho que a decisão do TSE foi, a meu ver, manifestamente errada e não se pode fazer uma ampliação da lei para punir gravemente com perda de mandato", disse ainda.

 

 

por Mariana Schreiber - Da BBC News Brasil em Brasília

CHILE - A contundente vitória do Partido Republicano na eleição do conselho encarregado de escrever uma nova Constituição pôs em evidência o crescimento das forças conservadoras no Chile, lideradas pelo pragmático José Antonio Kast.

A votação de domingo soou como uma severa advertência para o presidente Gabriel Boric, jovem liderança da renovação progressista na América Latina, mas não alterou de momento a relação de forças no Parlamento chileno, que segue dominado pela direita e esquerda tradicionais.

Entregou, no entanto, ao ultraconservador Partido Republicano a possibilidade de escrever praticamente à sua maneira a nova Carta Magna.

Com 23 dos 51 assentos da Assembleia Constituinte, a legenda pode vetar qualquer normativa, e caso consiga poucos votos da direita tradicional também tem a possibilidade de rejeitar as leis previamente aprovadas pelo Conselho de Especialistas.

Desde 2019, o Chile está empenhado em substituir a Constituição deixada pela ditadura de Augusto Pichonet (1973-1990), um processo de reescritura que inclui uma primeira tentativa falida e ao qual os republicanos sempre se opuseram. 

Contrários ao aborto, com um discurso anti-imigrantes e centrado na segurança pública, os republicanos conseguiram, em apenas quatro anos, se tornar o partido político mais votado desde a redemocratização.

José Antonio Kast foi crescendo desde outubro, quando passou a liderar as pesquisas presidenciais com vista às eleições de 2025. A pesquisa do instituto Cadem lhe deu, na semana passada, quase 20% da preferência dos entrevistados, seguido da prefeita direitista Evelyn Matthei. Boric, de 37 anos, não pode concorrer à reeleição.

Kast fundou o partido em junho de 2019, após deixar a também muito conservadora União Democrata Independente (UDI) e se colocar como alternativa à direita tradicional. "Deixamos de transmitir as ideias que defendíamos', disse em sua carta de saída.

Depois de anos turbulentos pelos protestos sociais que eclodiram em outubro de 2019, pela pandemia, por um declínio econômico e por uma crise de segurança pública e de imigração irregular, as ideias de "ordem e segurança" dos republicanos conseguiram convencer grande parte da sociedade chilena.

"É um partido de extrema direita com um projeto de restauração cultural, que questiona fortemente a direção que a direita tradicional tomou ao se aproximar das posições de centro e inclusive pegar algumas ideias de centro-esquerda", explica o cientista político da Universidade de Santiago, Marcelo Mella.

 

- Aceitar as regras democráticas -

Os republicanos declaram acreditar em Deus sem aderir a nenhuma religião e promovem "a família fundada no matrimônio entre um homem e uma mulher".

Nostálgicos de Pinochet, qualificam de "pronunciamento" (pronunciamento, em tradução literal) o Golpe de Estado que o militar liderou contra o socialista Salvador Allende e quando falam de sua ditadura, a chamam de "governo militar".

"As direitas radicais frequentemente se caracterizam por aceitar as regras da democracia, mas corroem certos princípios dela". Têm, por sua vez, a capacidade "de moderar o discurso", explica Stéphanie Alenda, diretora de pesquisa da Faculdade de Educação e Ciências Sociais da Universidade Andrés Bello.

Na América Latina, compartilham o ultraconservadorismo em matéria de valores com o ex-presidente Jair Bolsonaro e o salvadorenho Nayib Bukele. Kast é ainda mais liberal na economia e compartilha com o americano Donald Trump a dimensão patriótica, de defesa dos símbolos e fronteiras sob rígido controle.

No Chile, esse movimento surgiu como espelho da radicalização da esquerda, em um contexto de aborrecimento e descontentamento social e visão muito crítica sobre a incapacidade da política tradicional de entregar soluções, segundo Alenda.

 

- "Extremista em que?" -

Em sua vida política, Kast, de 57 anos, raramente perde a compostura e mantém sempre um sorriso, apesar das críticas ou dos ataques que recebe.

"Dizem que sou extremista, mas extremista em que?", se perguntou na última campanha presidencial, que perdeu para o jovem esquerdista Gabriel Boric.

"Não tem a estridência de um (Javier) Milei ou de Bolsonaro. Está muito longe dessa estridência em termos de psicologia pessoal", disse Eugenio Guzmán, decano da Faculdade de Governo da Universidade do Desenvolvimento.

Advogado pela Universidade Católica, é casado há mais de trinta anos com María Pía Adriasola, com quem compartilha a profissão e tem nove filhos.

"É uma liderança da extrema direita que nasce de uma sensibilidade culturalmente restauradora, mas que com o passar do tempo deu mostras de um pragmatismo muito forte", destaca Marcelo Mella.

Desde abril de 2022, preside a Political Network for Values (PNFV), uma rede internacional contra o aborto, onde sucedeu Katalin Novak, presidente da Hungria.

 

 

AFP

FRANÇA - A França vai proibir manifestações de grupos de extrema direita, anunciou na terça-feira (9) o ministro do Interior, Gérald Darmanin, após a polêmica causada por uma manifestação neonazista autorizada por Paris no sábado (6).

"Eu instruí os prefeitos" a emitirem "ordens de proibição" quando "qualquer ativista da extrema direita" ou associação solicitar autorização para se manifestar, disse Darmanin.

"Vamos deixar que os tribunais julguem se a jurisprudência permite que essas manifestações ocorram", acrescentou durante uma sessão de controle do governo na Assembleia Nacional (câmara baixa do Parlamento).

Cerca de 600 ativistas do Comitê 9 de Maio, de acordo com as autoridades, se manifestaram no sábado em Paris em um marco da morte acidental do militante de extrema direita Sebastien Deyzieu, em 1994.

Um jornalista da AFP descobriu que os manifestantes, vestidos de preto e muitas vezes mascarados, exibiam bandeiras pretas com a cruz celta - usada por supremacistas brancos.

As imagens desta manifestação causaram polêmica, especialmente enquanto as autoridades se esforçam para proibir os panelaços contra o presidente liberal Emmanuel Macron, organizados pelos sindicatos devido à sua polêmica reforma da Previdência.

A primeira-ministra, Élisabeth Borne, qualificou as imagens do ato desta terça-feira da extrema direita como "chocantes", mas considerou que não havia motivos para proibi-lo por perturbação da ordem pública, e defendeu o "direito de manifestação".

A oposição de esquerda exigiu uma explicação do governo por permitir que "500 neonazistas e fascistas" desfilassem por Paris, nas palavras do senador socialista David Assouline.

Até mesmo a líder de extrema direita Marine Le Pen, favorita nas pesquisas devido ao conflito social causado pela reforma da Previdência, qualificou a manifestação como "inadmissível".

 

 

AFP

SÃO PAULO/SP - Levantamento da agência .MAP indica resiliência do bolsonarismo e desmobilização da esquerda nas redes sociais desde as eleições. Perfis de direita fecharam fevereiro com 30,7% do engajamento, mapeado por meio de curtidas e comentários no Twitter e no Facebook, sendo que 87% deles se apresentam como bolsonaristas.

Esses perfis alavancaram a presença digital de Jair Bolsonaro (PL) no mês passado. O ex-presidente chegou ao fim de fevereiro com 41,9% de aprovação em 3,17 milhões de publicações que o mencionaram.

Em queda desde outubro, os perfis de esquerda perdem espaço mês após mês e tiveram 13% de participação no total. Mencionado em 4,6 milhões de publicações, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) teve aprovação em 54% dos comentários, faixa que se mantém desde setembro.

Michelle Bolsonaro, ex-primeira-dama, teve destaque no mês e foi a quarta figura política mais citada nas redes sociais em fevereiro, com 459,7 mil citações, com aprovação alinhada à de Bolsonaro, 41%.

A .MAP fez análise a partir de amostra extraída diariamente de um universo de 1,4 milhão de publicações no Twitter e no Facebook. Além do registro delas, a agência atribui peso a reações como curtidas, comentários e encaminhamentos.

 

 

por FÁBIO ZANINI / FOLHA de S.PAULO

EUA - A produção do filme de super-herói racista “Rebel’s Run”, baseado numa história em quadrinhos criada pelo blogueiro de extrema-direita Theodore Beale (também conhecido como “Vox Day”), “perdeu” seu financiamento coletivo de US$ 1 milhão e pode gerar prisões aos envolvidos por desfalque. O dinheiro levantado com financiamento coletivo foi aplicado numa investidora suspeita e sumiu.

O projeto do filme teve início em 2019, quando os seguidores de Beale começaram a contribuir para o futuro filme baseado num super-herói confederado criado por ele. Na ocasião, foi produzido um trailer que mostrava a protagonista lutando contra uma força policial global que caçava “conservadores de pensamento livre”.

No vídeo, a personagem Rebel era apresentada usando um bustiê inspirado na bandeira dos antigos Estados Confederados (que, historicamente, defenderam a manutenção da escravidão nos EUA enquanto lutava um “tipo diferente de guerra”. O vídeo também incluía trechos de uma entrevista com o escritor Chuck Dixon, que trabalhou nos quadrinhos de Batman e criou Bane, e com o produtor Daniel McNicol, que tem um punhado de créditos de produção em seu nome.

O longa seria dirigido por Scooter Downey (do documentário “Crossfire”), colaborador frequente do programa de extrema-direita “Tucker Carlson Tonight”, exibido na emissora Fox News. E foi graças aos nomes de Beale e Downey atrelados ao projeto que o filme arrecadou mais de US$ 1 milhão entre depósitos de financiadores individuais para sua produção.

Esse dinheiro deveria ser guardado enquanto os realizadores buscavam levantar mais verba para o orçamento do filme. Porém, três anos depois, o dinheiro evaporou, assim como as esperanças de Beale de fazer o filme. “Eu não contaria que a gente vá receber o dinheiro de volta”, disse ele num vídeo publicado para os seus fãs.

Beale não foi o primeiro ultraconservador a tentar realizar um filme. Na verdade, alguns projetos de tom similar chegaram muito mais longe que o dele, uma vez que existe mercado para isso. A empresa do comentarista Ben Shapiro, por exemplo, tem um site de streaming que oferece filmes de tom retrógrado, incluindo um thriller sobre um tiroteio na escola e um western estrelado pela atriz “cancelada” Gina Carano. No início deste ano, o site Breitbart News também distribuiu uma cinebiografia crítica a Hunter Biden, filho do presidente dos EUA Joe Biden.

Entretanto, o colapso de “Rebel’s Run” mostra que esse salto para o cinema não é algo livre de riscos.

Beale realmente achava que conseguiria fazer o filme.

Chamado de “Senhor das Trevas Supremo da Maligna Legião do Mal” pelos seus seguidores, ou seus “asseclas” como eles mesmos se descrevem, o apresentador encontrou “fama” propagando os seus discursos de ódio em meio a um público que frequentemente reclama de uma suposta influência progressista imposta a videogames e filmes de super-heróis e ficção científica.

Não por acaso, esse público já financiou várias histórias em quadrinhos de tom similar e encabeça campanhas de ódio contra artistas negros escalados como protagonistas em produções de fantasia.

O próprio Beale é integrante do movimento Gamergate (uma campanha sexista de assédio virtual na comunidade dos games) e, além de declarações racistas, já descreveu a homossexualidade como um “defeito de nascença”.

Diante desse histórico, ele dificilmente conseguiria investidores “tradicionais” para fazer seu filme. Por isso, acabou recorrendo à Ohana Capital Financial, com sede em Utah, uma empresa financeira que se apresenta como um “banco para os não-bancários”. Em 5 de novembro de 2020, ele decidiu transferir seu capital de US$ 1 milhão para lá, acreditando em juros maiores.

Porém, a tal Ohana Capital Financial foi criada por James Wolfgramm, um autoproclamado bilionário de criptomoedas que costumava postar várias fotos de seus carros esportivos para explicitar a sua riqueza. Mas uma acusação federal apresentada no mês passado provou que a riqueza de Wolfgramm era uma farsa. As fotos de carros foram retiradas de outros sites e o seu negócio de mineração de criptomoedas também era falso.

Segundo a acusação, Wolfgramm estava profundamente endividado com um dos outros clientes da sua empresa, que investiu mais de US$ 4 milhões em setembro de 2020 como parte de um pagamento a um fabricante chinês de máscaras profissionais de proteção contra covid-19 (produtos extremamente valorizados na época).

Wolfgramm supostamente sumiu com os milhões e, para realizar a transação, teria usado o dinheiro do filme que Beale havia depositado. Pouco tempo depois, conforme Beale narrou em um vídeo, ele e seus colaboradores ficaram desconfiados e entraram em contato com o FBI, o que desencadeou a investigação contra o golpista.

O proprietário da Ohana agora enfrenta quatro acusações de fraude eletrônica, tanto sobre o dinheiro de “Rebel’s Run” quanto sobre outros aspectos dos seus negócios. É possível que, com o tempo, os investidores do filme possam recuperar uma parte do seu dinheiro através de processos judiciais, mas toda essa polêmica fez Beale desistir de fazer o seu filme de super-herói.

Ele também afirma, sem qualquer tipo de provas, que o golpe financeiro foi um complô para prejudicar sua base de fãs de extrema-direita. “Suspeito fortemente que tudo isso foi uma operação direcionada e destinada a quebrar nossa comunidade”, disse ele.

Vale apontar que Beale ainda não desistiu de fazer filmes. Ele disse que está trabalhando em um roteiro de um filme que será estrelado pelo seu amigo, o ex-comediante antissemita Owen Benjamin. Neste novo projeto, Benjamin, que acredita que o pouso na lua foi forjado, vai interpretar um chefe da NASA.

 

 

Daniel Medeiros / PIPOCA MODERNA

SUÉCIA - Os três partidos de direita da Suécia chegaram a um acordo para formar um governo de coalizão, que terá o apoio no Parlamento da formação de extrema-direita Democratas da Suécia, anunciou nesta sexta-feira (14) o candidato a primeiro-ministro Ulf Kristersson.

"Os Moderados (conservadores), os Democrata-Cristãos e os Liberais formarão o governo e colaborarão com os Democratas da Suécia no Parlamento", declarou o líder do partido Moderados em uma entrevista coletiva.

A votação para a designação de Kristersson como primeiro-ministro acontecerá na segunda-feira.

Pouco depois do anúncio, a líder dos democrata-cristãos, Ebba Busch, informou que o país construirá novos reatores nucleares em resposta às crescentes necessidades de energia elétrica.

Nos últimos anos, a Suécia fechou seis de seus 12 reatores. Os que permanecem abertos geram quase 30% da energia elétrica usada no país.

A Suécia enfrenta dificuldades para encontrar fontes de energia alternativas viáveis para substituir a energia nuclear, pois as energias renováveis ainda não suprem de maneira de maneira completa as suas necessidades.

O governo social-democrata que comandou o país nos últimos oito anos era tradicionalmente contrário à construção de novos reatores, mas admitiu este ano que a energia nuclear é crucial para o futuro próximo.

O grupo de energia sueco Vattenfall afirmou em junho que examinava a possibilidade de construir ao menos dois pequenos reatores nucleares modulares.

As eleições parlamentares de 11 de setembro, nas quais a coalizão conservadora conquistou maioria estreita, foram marcadas pelo avanço do Democratas da Suécia (SD), partido de extrema-direita criado em 1988.

O partido foi o segundo mais votado, com 20,5% dos votos. Os quatro partidos de direita somam 176 das 349 cadeiras do Parlamento.

 

 

AFP

ITÁLIA - A direita do ex-primeiro-ministro Silvio Berlusconi e a extrema-direita Liga, de Matteo Salvini, exigiram na quarta-feira (20) a saída do antissistema Movimento 5 Estrelas em troca do apoio a um novo governo na Itália liderado por Mario Draghi.

"Os partidos de centro-direita são a favor de um 'novo acordo' de governo e vão contribuir para a solução dos problemas do país, mas somente com um novo Executivo, profundamente renovado, liderado por Mario Draghi e sem a participação do Movimento 5 Estrelas", anunciaram os partidos em uma nota oficial.

A crise no governo começou na semana passada por membros antissistema que consideraram que vários pontos de um decreto-chave proposto por Draghi são contrários a seus princípios.

O desfecho ainda é incerto e são várias as soluções possíveis, entre elas, eleições antecipadas em setembro ou outubro.

O primeiro-ministro italiano Mario Draghi assegurou nesta quarta-feira ao Senado que a única saída para a atual crise política pela qual a Itália está passando é chegar a um novo "acordo" entre as partes em disputa.

"O único caminho a seguir, se quisermos ficar juntos, é reconstruir um pacto (de governo) com coragem, abnegação e credibilidade", propôs Draghi depois de perder o apoio de um partido de coalizão nacional que presidiu na semana passada.

Durante seu discurso, que terminará com uma moção de confiança, Draghi alertou que "a Itália não precisa mostrar confiança aparente, que desaparece quando se trata de tomar medidas difíceis".

O ex-presidente do Banco Central Europeu questionou diretamente os partidos de sua ampla coalizão que inclui da direita à esquerda: "Vocês, partidos e parlamentares, estão prontos para reconstruir esse pacto? Estão prontos para confirmar esse esforço que nos primeiros meses e depois ficou mais fraco?" ele perguntou.

"A resposta a essa pergunta não deve ser dada a mim, mas a todos os italianos", disse ele. "A Itália é forte quando está unida", acrescentou.

Os desafios internos (recuperação econômica, inflação, emprego) e externos (independência energética, guerra na Ucrânia) que a Itália e a União Europeia enfrentam "exigem um governo verdadeiramente forte e unido e um Parlamento que o acompanhe com convicção", sublinhou.

Draghi também enviou uma mensagem aos antissistema, que na semana passada retiraram o apoio a um decreto-lei fundamental, referindo-se à introdução de um salário mínimo, que a direita questiona e é uma das questões que suscita fortes disputas.

"É importante para reduzir pobreza, mas pode melhorar", frisou, uma frase interpretada como uma abertura.

No entanto, reconheceu que as disputas internas e o "desejo de se distinguir" de alguns partidos, aludindo ao antissistema do Movimento 5 Estrelas, minaram a confiança no seu governo.

"Um primeiro-ministro que não foi eleito deve ter o maior apoio possível. A unidade nacional é a garantia", afirmou.

Uma eventual queda do governo de unidade poderia desencadear uma onda de revolta social diante da inflação galopante, ameaçar o gigantesco plano de recuperação financiado pela União Europeia e alimentar o nervosismo dos mercados.

Segundo as pesquisas, a maioria dos italianos quer que Draghi permaneça no cargo, uma das razões pelas quais ele recuou e não confirmou sua renúncia.

O primeiro-ministro deve comparecer perante a Câmara dos Deputados na quinta-feira, de acordo com o método decidido pela república parlamentar.

Após a abertura do debate, em que cada partido ilustrará sua posição, um voto de confiança definirá com qual maioria conta para continuar governando ou não.

 

 

AFP

ÁUSTRIA - O líder do Partido da Liberdade (FPO) da Áustria, Norbert Hofer, deixou o cargo na terça-feira, mas claramente não apoiou seu deputado de alto perfil e rival Herbert Kickl para sucedê-lo.

Hofer, amplamente visto como o rosto mais agradável do partido anti-islã e anti-imigração que deixou o governo em meio a um escândalo dois anos atrás, esteve perto de vencer as eleições presidenciais da Áustria em 2016, apenas para perder uma nova corrida.

Ele assumiu a liderança de Heinz-Christian Strache depois que um escândalo de vídeo em 2019 forçou Strache a renunciar ao cargo de vice-chanceler austríaco e derrubou um governo de coalizão liderado pelo conservador Sebastian Kurz, que agora governa com os verdes.

“Nos últimos meses foi possível voltar a estabilizar o partido e aproximá-lo da marca dos 20% nas pesquisas de opinião. Assim, montei o partido para que ele tenha sucesso também nos próximos anos. Minha própria jornada à frente da FPO, no entanto, termina hoje ", disse Hofer em um comunicado do partido.

O comunicado não disse por que Hofer, 50, estava parando de fumar, mas referiu-se a um tratamento recente para problemas nas costas. Ele anda com uma bengala desde um acidente de parapente em 2003.

Houve vários relatos na mídia austríaca de uma rixa com Kickl, uma figura mais abrasiva que assume uma linha mais dura em se opor às restrições do coronavírus e atacar Kurz.

Seu anúncio ainda surpreendeu o partido, que há muito tempo ocupa o terceiro lugar nas pesquisas, atrás dos conservadores de Kurz e da oposição social-democrata.

"Fiquei surpreso com os eventos do dia", disse o peso-pesado do partido Manfred Haimbuchner, líder da FPO na província da Alta Áustria, em um comunicado.

Sobre o próximo líder, a declaração de Hofer dizia apenas: "Desejo ao meu sucessor neste post boa sorte para o futuro."

 

 

*Por: REUTERS

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