SÃO PAULO/SP - A garrafa verde da Heineken é inconfundível para os fãs da bebida no Brasil, em que a maioria das cervejarias trabalha com o vidro marrom. Mas o que confere à marca sua identidade se tornou um desafio para a distribuição no País, onde a empresa enfrenta dificuldades para encontrar as garrafas, segundo fonte do setor hoteleiro ouvida pela DINHEIRO. O grupo foi alertado pela Heineken sobre o problema, que está afetando as entregas da cerveja. Neste início de ano, bares e restaurantes da rede presidida pelo executivo que conversou com a reportagem receberam os pedidos em latas de cerveja, substitutas das garrafas e long necks. Procurada, a Heineken não quis comentar e alegou estar em período de silêncio.
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O cenário é fruto do aumento de consumo e da mudança de hábitos, que impulsionou uma demanda não prevista por algumas empresas, segundo a Associação Brasileira da Indústria de Vidro (Abividro). A entidade afirma em nota que todos os contratos foram cumpridos e somente as compras não programadas sofrem com a escassez. “A dinâmica da produção de vidro é inelástica. Trabalhamos somente com o que é antecipado pelos pedidos”, disse Lucien Belmonte, presidente da associação. A alta do dólar é outro agravante, uma vez que, embora pequena, a parcela de empresas que importam embalagens em vidro também não consegue migrar para o mercado nacional pela falta de oferta.
A situação deve se restabelecer até o fim de 2023, com a expansão de 30% da capacidade produtiva na indústria. A francesa Verallia, da divisão de embalagens da Saint-Gobain, está investindo R$ 500 milhões em um novo forno na fábrica de Campo Bom (RS), enquanto a Owens Illinois, maior fabricante do mundo, investirá cerca de R$ 1 bilhão em duas novas plantas no Brasil.
Dolf van den Brink, CEO global da Heineken, deve vir ao País neste início do ano para acompanhar a saga das garrafas verdes. No mercado, a solução foi verticalizar. A Ambev, maior concorrente da holandesa, fará um aporte de R$ 870 milhões para construir sua segunda fábrica de embalagens de vidro. Mas a nova planta, no Paraná, só deve entrar em operação em 2025, seguindo a estratégia da companhia de, até lá, trabalhar apenas com embalagens retornáveis ou feitas de materiais reciclados.
Com investimento médio de US$ 100 milhões, uma planta produtiva tem capacidade para fabricação de 350 toneladas de vidro por dia. Considerando o modelo da long neck, essa produção representaria em torno de 2 milhões de garrafas por dia. Na avaliação de Belmonte, a movimentação será suficiente para desafogar a indústria no próximo ano. Em 2022, as empresas devem seguir alertas ao risco de escassez.
Nada de novo No verão de retomada da economia, bares e restaurantes voltaram a lotar. A Abrasel, entidade do setor, indica que a demanda deste fim de ano esteve 3% abaixo frente 2019, o que já é um avanço significativo para uma das atividades mais impactadas na pandemia. O consumo da cerveja também subiu: 8% nos últimos dois anos, pelos dados do Euromonitor.
A mudança vem do aumento das buscas por long neck e cervejas artesanais, associadas ao hábito de beber em casa. Apesar do momento relativamente positivo, não foi apenas a cerveja responsável pela escassez de garrafas. O que mais sobrecarregou a indústria foi o mercado de vinhos, cujo consumo dobrou nesse período.
Percival Maricato, diretor da Abrasel, explica que não é a primeira vez que a distribuição é afetada, embora o fenômeno não prejudique as vendas no setor. “Embalagens substitutas suprem esse consumo em bares e restaurantes”, disse. Para a Heineken, no entanto, o abastecimento da emblemática garrafa verde garante a presença da marca em um mercado disputado como o brasileiro. Por isso, a saga se torna crucial para as cervejarias.
Beatriz Pacheco / ISTOÉ DINHEIRO