GUIANA - O ditador da Venezuela, Nicolás Maduro, e o presidente da Guiana, Irfaan Ali, reuniram-se nesta quinta-feira (14) pela primeira vez para tentar estabelecer um diálogo sobre Essequibo, território guianense rico em recursos naturais reivindicado por Caracas, numa disputa que alimentou temores por um conflito na América do Sul.
Segundo declarações da delegação guianense, os dois líderes se comprometeram a manter a região pacífica. Um aperto de mãos, seguido de aplausos, fechou o encontro de cerca de duas horas, de acordo com um vídeo enviado do Ministério da Comunicação e Informação da Venezuela. Estava previsto um comunicado conjunto das duas delegações.
Segundo informações obtidas pela reportagem, os líderes concordaram em continuar com o diálogo e marcar uma data para novas reuniões, que serão periódicas, a cada três ou seis meses. No encontro desta quinta, contudo, eles não recuaram de seus posicionamentos sobre Essequibo. O presidente guianense reiterou que seu governo tem "todo o direito" de explorar recursos em seu "espaço soberano".
"A Guiana não é o agressor, a Guiana não está buscando a guerra, a Guiana se reserva o direito de trabalhar com nossos aliados para garantir a defesa do nosso país", afirmou Irfaan Ali a jornalistas após a reunião, buscando ainda tranquilizar investidores. "Deixei muito claro que a Guiana tem todo o direito [...] de facilitar qualquer investimento, qualquer parceria [...], a emissão de qualquer licença e a concessão de qualquer contrato em nosso espaço soberano."
O regime da Venezuela descreveu a reunião como "frutífera". Na plataforma X, o perfil do Ministério de Comunicação e Informação do país afirmou que o encontro ratifica a vontade de se estabelecer um "diálogo contínuo em favor do povo" venezuelano. O ditador Maduro não havia se pronunciado sobre a reunião até a noite desta quinta.
Não são esperados, portanto, mudanças significativas nos posicionamentos dos países sobre Essequibo. Realizada no país caribenho de São Vicente e Granadinas, a reunião aconteceu após o aumento da tensão na disputa regional, agravada pelo plebiscito promovido pelo regime venezuelano em 3 de dezembro.
Na votação, em que as cinco questões favoreciam uma resposta simpática aos interesses de Caracas, 96% dos eleitores teriam votado favoravelmente à criação de um novo estado em Essequibo e da concessão de nacionalidade venezuelana aos 125 mil habitantes da região.
Dois dias antes do plebiscito, a Corte Internacional de Justiça (CIJ) exortou a Venezuela a não anexar o território. O guianense Ali tem dito que a CIJ é a responsável por "decidir a controvérsia sobre as fronteiras entre Guiana e Venezuela". "Nos mantemos firmes nesta questão", escreveu ele em redes sociais antes do encontro. Maduro, porém, não reconhece a jurisdição da CIJ no caso.
A reunião foi promovida pela Comunidade de Estados Latino-Americanos e Caribenhos (Celac) e pela Caricom, com o apoio do Brasil, em meio à crescente preocupação com os cada vez mais duros confrontos verbais entre os dois governantes sobre o Essequibo, uma área de 160.000 km² rica em petróleo e outros recursos naturais, administrada por Georgetown e reivindicada por Caracas.
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) havia sido convidado para acompanhar o encontro, mas decidiu enviar o chanceler brasileiro Celso Amorim, assessor especial para assuntos internacionais.
Maduro disse na segunda (11) que considerava o encontro "um grande feito" para "abordar de forma direta a controvérsia territorial". Em resposta, Ali divulgou uma carta que enviou a Ralph Gonsalves, primeiro-ministro do país caribenho. No documento, o guianense negou que a disputa estivesse na agenda e insistiu em seu posicionamento de que o conflito deve ser decidido na CIJ.
"Trago os fatos comigo", afirmou Ali, citado pela mídia guianense, ao chegar a Kingstown, a capital de São Vicente e Granadinas.
"Venho aqui para buscar, pela única via possível, o caminho do diálogo e da negociação, soluções efetivas", disse Maduro também antes do encontro.
O encontro bilateral foi anunciado no sábado (9) em um comunicado da Celac divulgado horas depois de uma conversa telefônica de Lula com Maduro, na qual o brasileiro pediu ao venezuelano para "evitar medidas unilaterais que levem a uma escalada da situação".
As falas de Lula repetem a declaração na qual Brasil, Uruguai, Paraguai, Argentina, Colômbia, Peru, Equador e Chile manifestaram "profunda preocupação" com o assunto, divulgada durante a Cúpula do Mercosul na semana passada. "A América Latina deve ser um território de paz e, no presente caso, trabalhar com todas as ferramentas de sua longa tradição de diálogo", diz o comunicado.