SÃO PAULO/SP - A pandemia foi como um terremoto na já capenga economia brasileira. Depois de um ano salvo pelo Auxílio Emergencial, a realidade se impôs numa primeira onda que abalou os resultados do mercado no terceiro trimestre deste ano. As vendas de varejo no Carrefour e no Grupo Pão de Açúcar caíram 8% e 5%, respectivamente, pressionadas pelo declínio de categorias não alimentares. E este parece ser só o começo. Com a quarta maior taxa de desemprego do mundo, segundo ranking da Austin Rating, e ameaça de recessão, o cenário que se desenha para 2022 no Brasil é sombrio. “Ainda há incertezas sobre o ano que vem, mas a perspectiva no setor é negativa”, disse Eduardo Terra, presidente da Sociedade Brasileira de Varejo e Consumo. Ao longo do ano, o consumidor desceu para marcas mais baratas e migrou em parte para o atacarejo. Seu último recurso agora é enxugar o carrinho de compras. Se confirmada a tendência, veremos a retração do consumo alimentar — um dos mais resilientes a crises —, o que não acontecia desde 2016.
Nos supermercados, a reação foi rápida. Para o GPA, uma das saídas foi apagar o Extra Hiper do seu portfólio. O grupo fechou acordo de R$ 5,2 bilhões com a rede de atacarejo Assaí, controlada pela mesma holding, para passar 71 lojas à bandeira irmã. Dos 32 hipermercados que seguem nas mãos do GPA, 28 serão readequados a formatos mais rentáveis e quatro serão desinvestidos. A receita da companhia com o Extra Hiper recuou 14% no último trimestre ante o mesmo período do ano passado, para R$ 2,6 bilhões. No relatório financeiro, a varejista atribuiu o resultado ao reposicionamento de preço regular e à retomada das promoções para mitigar os efeitos da economia sobre as vendas. Terra lembra que a alta dos juros e a inflação de dois dígitos impactam principalmente o consumo da população de baixa renda, maioria dos 25 milhões de trabalhadores autônomos no País, segundo a PNAD Contínua. Desprotegido das perdas de poder aquisitivo, o grupo deve cortar gastos de itens essenciais no próximo ano.
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RITMO DE ADEUS Às vésperas do fim, a rede Extra Hiper está mais no clima de Black Friday que o restante do setor, com descontos para liquidar estoque de eletrônicos e produtos têxteis. Outras bandeiras acompanham o ritmo de saldão, mas a iniciativa tem prazo para acabar: março de 2022 — quando se conclui a transição para o Assaí. Em videoconferência com o mercado no início deste mês, Jorge Faiçal, CEO do GPA, apontou a economia como freio para políticas de descontos. Em vez disso, o grupo tenta sustentar as vendas pelo incremento da operação on-line, pela expansão da rede física — com 100 novas lojas até 2024 — e pelo fortalecimento das marcas próprias, que representaram 21% da receita no terceiro trimestre.
O Carrefour também investe na projeção da sua carteira de produtos, motivado pela margem maior e mais previsibilidade no estoque. “Tiramos os atravessadores do processo e ganhamos mais rastreabilidade”, afirmou Joaquim Sousa, diretor-comercial da rede no Brasil. O desenvolvimento de sete células de trabalho com produtores locais permitiu à companhia driblar o encarecimento do frete e diminuir o impacto da inflação sobre a categoria alimentar, para a qual a fatia dos custos logísticos pesa mais. Graças à dinâmica, a empresa consegue organizar campanhas sazonais de congelamento de preços das marcas próprias, que vêm crescendo 20% ao ano.
Enquanto a concorrência abandona o híper, o Carrefour pretende manter o formato. “Essas lojas nos permitem impulsionar o consumo nas categorias não alimentares”, disse Sousa. O executivo explica que, com um fluxo médio de 12 milhões de brasileiros, a planta alavanca negócios satélites, como as drogarias e postos de combustível. O posicionamento é crucial também para o cartão da marca, porta de entrada para a compra de eletroeletrônicos. O faturamento do Banco Carrefour no terceiro trimestre foi de R$ 12,3 bilhões, aumento de 25% ante o mesmo período de 2020, puxado pela alta de 41% do crédito no atacado e de 17% no varejo. “O hiper tem uma volumetria estratégica para o negócio”, afirmou o executivo.
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Beatriz Pacheco / ISTOÉ DINHEIRO