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RIO DE JANEIRO/RJ - O primeiro Congresso Nacional de Manguezais (ConMangue) começou na segunda-feira (17), em Niterói, região metropolitana do Rio de Janeiro, com alertas sobre as condições do mar e da necessidade de estancar o processo de degradação das águas. Na abertura do encontro, o coordenador Nacional da Comissão Nacional de Fortalecimento das Reservas Extrativistas e Povos e Comunidades Tradicionais Extrativistas Costeiros e Marinhos (Confrem), Flávio Lontro, disse esperar que o somatório de vozes faça um coro para que empresários e governos consigam ouvir o apelo de que o mar está morrendo.

“A previsão de futuro que a gente projeta são as piores possíveis, porque se a coisa for do jeito que está, a Terra vai virar um deserto e o mar vai ser inavegável. Para nós que dependemos do mar para trabalhar e fazer o nosso dia a dia vai ser muito ruim”, alertou.

Lontro adiantou que pretende encaminhar uma proposta ao prefeito de Niterói, Axel Grael, para que seja criada uma matéria nas escolas que ensine os conceitos de preservação ambiental aos estudantes. Ele sugere ainda que o prefeito encaminhe a proposta a outros prefeitos do país.

“Tomara que o ConMangue start [comece] essa coisa toda. Vou reforçar com o prefeito para ver se consigo sensibilizá-lo para inserir a grade de meio ambiente nas escolas para formar as crianças para podermos mudar um pouco o panorama futuro, também tenho filhos e netos e não é isso que quero deixar para eles”, disse.

O presidente da Guardiões do Mar e coordenador-geral do Projeto Do Mangue ao Mar, Pedro Paulo Belga, lembrou que a ONG foi criada para provar que a Baía de Guanabara estava viva, e ao longo do tempo vem realizando ações para garantir a qualidade dos manguezais da região.

“É intenção com este congresso que nos próximos dias possamos ver o quanto os manguezais [são resilientes], mas nós também somos resilientes. Precisamos juntar nesses quatro dias a academia, o poder público, as unidades de conservação, as ONGs e os povos da pesca. Acho que daqui vão sair grandes ideias, porque estamos trabalhando e falando com todos que vivem no manguezal e do manguezal.

Pedro Belga informou que em uma década, de 2013 a abril de 2023, em projetos desenvolvidos pelas instituições, foram plantadas 120 mil árvores nos mangues da Baía de Guanabara. “Nós plantamos 33 árvores por dia, mil árvores por mês, 12 mil árvores por ano e chegamos a marca de 120 mil árvores plantadas na Baía de Guanabara”, revelou.

O biólogo lembrou que a preservação dos mangues influencia até a socioeconomia. “A gente não plantou só para a Baía de Guanabara, plantamos para o mundo, porque os mangues são sequestradores de carbono, geram sociobiodiversidade, fomentam a socioeconomia, então, a minha gratidão a todos vocês que estão aqui hoje”.

Segundo Pedro Belga, a maior faixa contínua de manguezais conservados do estado do Rio de Janeiro está na Baía de Guanabara. “São milhares de famílias de pescadores artesanais, de catadores de caranguejo e quilombolas que vivem neles e deles, e, por isso, nós cuidamos deles há tanto tempo. Nos últimos 25 anos, a Guardiões do Mar dedicou boa parte de seus trabalhos na conservação e na recuperação desses ambientes. Além disso, trabalhamos a educação ambiental para que as pessoas entendam a real importância dos manguezais, e que mesmo estando longe deles, morando na serra, por exemplo, elas podem de forma positiva ou negativa impactar esse ecossistema”, disse.

A diretora do Departamento de Oceano e Gestão Costeira do Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima, Ana Paula Prates, informou que entre as prioridades da pasta para a política que trata da mudança de clima no Brasil está a formulação de medidas de conservação dos manguezais.

“Trabalhar fortemente com ações de conservação para os ambientes mais vulneráveis à mudança do clima e ao mesmo tempo os ambientes que nos auxiliam no combate a essas mudanças, como é o caso dos manguezais e recifes de corais. Dentro das nossas prioridades está a construção de uma estratégia nacional para conservação e uso sustentável dos manguezais do Brasil. Queremos completar até o ano que vem, e contamos muito com esses espaços como o Congresso e com toda essa participação, principalmente, dos movimentos sociais como a Confrem que está aí representada”, disse por meio de vídeo.

A gerente setorial de Responsabilidade Social da Transpetro, Juliana Assis, disse que a participação dela no encontro reafirma o diálogo da empresa com comunidades tradicionais relacionadas à pesca da região. “Participar do primeiro Congresso Nacional de Manguezais é reafirmar nosso diálogo e relacionamento com as comunidades tradicionais de pescadores artesanais, caiçaras, catadores de caranguejo e quilombolas. Temos várias ações previstas, o que inclui atividades de limpeza nas baías de Guanabara e Sepetiba e outras iniciativas que vão além da pesca, como as oficinas de turismo, previstas para começarem no ano que vem, e a formação de multiplicadores adolescentes para replicar conhecimento sobre educação ambiental”, disse ao apresentar as linhas de atuação socioambiental da companhia, voltadas ao desenvolvimento humano e social das comunidades onde atua.

O prefeito de Niterói, Axel Grael, comemorou o fato do ConMangue ocorrer na cidade. “Realizar o Congresso Nacional de Manguezais em Niterói é uma iniciativa que tem tudo a ver com nossas políticas públicas que ajudam a preservar nosso meio ambiente e nosso ecossistema. Vamos incluir a sociedade no debate em torno desses ambientes que estão em constante modificação e integram importantes berçários de nossa fauna”, disse em mensagem.

O prefeito não participou da abertura do encontro porque viajou a Cabo Frio por causa da morte do prefeito da cidade José Bonifácio, 78 anos de idade, vítima de câncer de fígado.

Certificado

Antes de começar, o ConMangue, que é produzido pela ONG Guardiões do Mar, por meio do Projeto Do Mangue ao Mar, em convênio com a Transpetro, recebeu o Selo Prima Consciência Climática. “A certificação de neutralização de carbono resulta de um levantamento de todas as emissões de gases que contribuem para o efeito estufa, previstas durante o evento, bem como garante, a partir de um cálculo seguro, a compensação ambiental do carbono emitido”, informaram os organizadores.

Para reduzir os impactos gerados, a Guardiões do Mar plantará mudas de mangue em uma área de um hectare da APA de Guapi-Mirim.

 

 

Por Cristina Indio do Brasil - Repórter da Agência Brasil

SÃO PAULO/SP - Quando se pensa em Amazônia, a imagem que normalmente vem à cabeça é de uma floresta imensa, de árvores altas, com áreas de mata cortadas por grandes corpos d'água. Mas há diversas fisionomias amazônicas. E muitos não imaginam que o bioma também guarde ricos manguezais.

Isso mesmo: mangues amazônicos.

Quando se fala em Amazônia, tipicamente se faz menção à biodiversidade ali presente. Com os seus mangues, não é diferente. Especialmente, biodiversidade animal, diz Marcus Fernandes, coordenador do programa Promangue, do projeto Mangues da Amazônia, e responsável pelo Lama (Laboratório de Ecologia de Manguezal), na UFPA (Universidade Federal do Pará).

Enquanto as áreas de floresta concentram grande diversidade vegetal, o mesmo não é visto no mangue. São somente seis as espécies -três mangues-vermelhos, dois mangues-pretos e um mangue-branco- que dominam os manguezais brasileiros, diz Fernandes.

Expandindo um pouco mais e olhando também para as áreas de transição entre mangues e outras formações, a vegetação ganha riqueza.

Plantas de mangue precisam estar adaptadas à sobrevivência em áreas sob influência da água salgada do mar. O sal, inclusive, é um dos pontos de limitação de crescimento da vegetação de manguezais.

Mas nos mangues amazônicos a situação é um tanto diferente, com uma vegetação bastante desenvolvida, com árvores que chegam a até 40 metros de altura, diz o especialista da UFPA.

"Isso é uma característica de florestas de terra firme", diz Fernandes, citando árvores de mangue no Equador que chegam a até 60 metros de altura. "Isso não é uma coisa que a gente vê na costa, na beira do mar, então é meio difícil imaginar essa exuberância florestal. Sempre pensamos numa floresta menor."

E o que explicaria árvores tão mais desenvolvidas nos mangues amazônicos?

Segundo Fernandes, a enorme bacia de água doce que banha a região é um dos fatores. Além disso, os elevados índices de chuva na região amazônica também ajudam a, entre outras coisas, controlar o sal no ambiente.

Ou seja, diz Fernandes, em outras regiões de mangue, a vegetação local precisa gastar grande parte da sua energia para sobreviver. Já na Amazônia, a situação é mais favorável para um investimento maior de recursos no crescimento.

"Quanto maior esse manguezal, maior é o seu estoque de carbono", afirma o pesquisador.

Dentro do projeto Mangues da Amazônia, do Instituto Peabiru, Fernandes vem trabalhando com recuperação de áreas degradadas de manguezal. Com dois anos de existência, a iniciativa, que é patrocinada pela Petrobras e que já recebeu verbas do Fundo Amazônia, congelado por ações do governo Jair Bolsonaro (PL), já plantou cerca de 7 hectares e pretende chegar a 12 hectares até o fim do ano.

O projeto atua em três reservas extrativistas marinhas no Pará: a de Caeté-Taperaçu, a de Tracuateua e a de Araí-Peroba. Ou seja, são áreas em que pode haver algum tipo de exploração.

Agora você pode estar se perguntando: não são poucos hectares plantados para dois anos de ações? Especialmente ao se pensar que a região, segundo o pesquisador, tem cerca de 8.000 km² de mangues.

De certa forma, sim, considerando os tamanhos desproporcionalmente grandes que encontramos ao falar de Amazônia.

Mas, ao menos nesse momento, há pouca ameaça aos mangues amazônicos, e as áreas devastadas não são tão amplas, afirma o pesquisador. Trata-se de uma ação preventiva, afirma, baseada na educação das populações que já fazem uso tradicional do mangue.

"Todo mundo, do menino de três anos até o adulto, vai plantar com a gente. Brincamos de plantar manguezal, o que cria responsabilidade com o sistema. Entender que não tem que cortar, mas se precisar, ele sabe como fazer o replantio. É preventivo, é a educação ambiental. O replantio é um método de ensinar a proteger."

O projeto afirma ter atingido cerca de 6.000 pessoas direta e indiretamente. Como parte do processo de plantio, foram mantidos viveiros nas reservas extrativistas que são parte do projeto. Além disso, foram mapeadas áreas de retirada de caranguejo-uçá e de corte de madeira, com o objetivo de auxiliar no desenvolvimento de planos de manejo para as reservas que ainda não os têm.

O pesquisador espera que, com a evolução dos mecanismos financeiros relacionados a carbono, os manguezais preservados da Amazônia acabem tendo mais dinheiro garantido para períodos maiores de tempo, o que poderia facilitar os projetos de preservação.

Apesar de a degradação não ser um problema tão grande nos mangues amazônicos, há alguns problemas em comum com os do resto do país. Entre eles, estão a questão do lixo e esgoto nos locais, a ideia de que são lugares improdutivos e um certo preconceito quanto ao cheiro costumeiramente não muito agradável desses locais ricos em material orgânico.

"Os que mais fedem são os melhores", brinca Fernandes, que aponta a necessidade de ampliar o conhecimento da população sobre a importância dos manguezais.

 

 

PHILLIPPE WATANABE / FOLHA de S.PAULO

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