SÃO PAULO/SP - O presidente do Tribunal Superior Eleitoral, Alexandre de Moraes, discutiu na noite de sexta (2) a crise instalada na área de segurança de São Paulo com o governador eleito do estado, Tarcísio de Freitas (Republicanos).
Moraes é o inimigo público número 1 do bolsonarismo, e o encontro no apartamento do ministro nos Jardins, área nobre da capital paulista, já está sendo criticado nas redes de apoiadores do presidente Jair Bolsonaro (PL).
Como a Folha mostrou na sexta pela manhã, a indicação do deputado bolsonarista Capitão Derrite (PL-SP) para ocupar a Secretaria da Segurança de São Paulo gerou a primeira grande crise da transição comandada por Tarcísio.
Delegados, integrantes do Ministério Público e do Judiciário questionaram a escolha, apontando diversos problemas nela. Para começar, Derrite é um ex-PM que busca, a exemplo do que Bolsonaro fez com o Exército, fundir sua imagem pública à da corporação.
Além disso, ele defendeu como deputado poder de investigação para policiais militares, tirando a exclusividade da Polícia Civil. Como a Segurança paulista sempre viveu um equilíbrio precário entre o poder da PM, a maior força (93 mil policiais), e a Civil (27 mil integrantes), o pêndulo se moveria de forma inédita para o lado militarizado.
Por fim, Derrite esposa pensamentos bolsonaristas que vão do ideário do astrólogo Olavo de Carvalho, já falecido guru da turma, à crítica ao bem-sucedido programa de emprego de câmeras em uniformes de policiais --que ajudou a derrubar a letalidade policial onde foi aplicado. O padrinho de sua indicação é o deputado e filho presidencial Eduardo Bolsonaro (PL).
A questão se torna nacional porque Moraes mantém grande influência em setores da Polícia Civil desde que foi secretário de Segurança do governo Geraldo Alckmin (então PSDB, hoje vice-presidente eleito pelo PSB), de 2015 a 2016.
Além disso, ele mantém uma rede de aliados no Judiciário paulista, que se uniram na crítica a Derrite. Até aqui, o secretário indicado não se pronunciou sobre o caso. Na quinta (30), após o anúncio da escolha, Tarcísio tergiversou quando questionado acerca do apoio de Derrite na internet à campanha golpista de Bolsonaro que coloca em dúvida a lisura das eleições.
O teor da conversa entre ele e Moraes ainda não transpareceu. Aliados do governador eleito sugerem algum tipo de armistício no caso de Tarcísio insistir no nome de Derrite, que na ativa da PM foi apenas um tenente --ele virou capitão depois, indo à reserva no Corpo de Bombeiros em 2018 para entrar na política.
Moraes gera temor reverencial entre aliados do presidente, dada sua dura campanha contra as intentonas golpistas do grupo. O lance mais recente foi rejeitar o parecer mambembe contra as urnas eletrônicas do PL e ainda aplicar uma multa de R$ 23 milhões ao partido por litigância de má-fé.
Este é um ponto criticado inclusive por policiais militares com tendências bolsonaristas, que são bastante influentes na tropa, já que teriam de prestar continência a um subalterno mais jovem, de 38 anos. Na corporação, o topo da carreira é a patente de coronel.
Para Tarcísio, é um jogo complexo. Ele precisa agradar o bolsonarismo que o ajudou a chegar ao poder de forma meteórica, saindo do Ministério da Infraestrutura para a chefia do principal estado do país, mas trabalha também com uma ala técnica, com aliados como Gilberto Kassab (PSD), um dos fiadores de sua candidatura, e também com parte da máquina existente após quase 30 anos de PSDB no poder local.
Ele ofertou um agrado à Polícia Civil sugerindo o nome do atual delegado-geral, Osvaldo Nico Gonçalves, para ser o adjunto de Derrite. Nico não deu uma resposta, embora seus aliados digam que ele irá aceitar, e o tema será debatido em reunião na semana que vem no Conselho da corporação.
A articulação inclui colocar um aliado de Nico, Arthur Dian, como delegado-geral. Toda essa arquitetura tem a bênção do deputado estadual paulista Delegado Olin (PP), que participou de reunião com os dois policiais e Tarcísio na quinta.
por IGOR GIELOW / FOLHA de S.PAULO