BRASÍLIA/DF - Os representantes de universidades privadas preencheram mais da metade da agenda de encontros com o ministro da Educação, Milton Ribeiro, com dirigentes do ensino superior aos longos dos 4 primeiros meses dele à frente do cargo.
Sua gestão começou em 16 de julho – mas ele ficou afastado quase 10 dias para tratar-se de covid-19– e até 25 de novembro, foram 32 encontros com emissários de empresas de ensino particular e 25 com representantes de universidades públicas. Onze das reuniões envolviam faculdades ligadas a instituições religiosas. Ribeiro é pastor.
Dos 3 ministros que passaram no Ministério da Educação na gestão de Jair Bolsonaro (sem partido), ele é o único que se encontrou com mais representantes de instituições de ensino superior privadas do que públicas. A comparação foi feita com os 4 primeiros meses de gestão de cada ministro.
O aumento de dirigentes de entidades particulares não foi à toa. A pandemia e as propostas de reforma tributária do governo preocupam as entidades, que passaram a se movimentar nos bastidores. O principal destino foi o MEC. Além da pasta, o Ministério da Economia, a Presidência da República e parlamentares também estão sendo procurados.
Pautas
Os dirigentes de entidades públicas são contra a reforma tributária. Se aprovada, eles relatam que aumentará a tributação do ensino superior para até 12% por causa da CBS (Contribuição Social sobre Operações com Bens e Serviços), que deve ser a substituta dos atuais Pis e Cofins. Atualmente pagam, em média, 3,75%.
Segundo o diretor-executivo da Abmes (Associação Brasileira das Mantenedoras do Ensino Superior), Sólon Caldas, essa mudança, caso seja aplicada, irá tornar as mensalidades mais caras.
Outro ponto é o Prouni. A reforma altera a base de cálculo e retira 2 impostos. Atualmente, contam IR, Contribuição Social, PIS e Cofins. Ficarão apenas os 2 primeiros, já que os outros foram unificados e não foram incluídos no cálculo do programa. O temor é que, somado à crise financeira que atingiu o país, o número de alunos caia. A isso, também há a expectativa de perda de alunos, decorrente de eventual aumento nas mensalidades.
Os representantes também pedem a criação do Fies emergencial. Em 2014, foram 730 mil estudantes. Em 2020, apenas 40.000. Com a crise, entidades temem fechar as portas.
Também teve destaque nas reuniões com o ministro o tema das aulas remotas. A portaria 544, que permitiu a modalidade, vence em 31 de dezembro junto ao decreto da calamidade. Foi prorrogada. Mas os reitores pedem mais clareza sobre o processo. Na captação de alunos, relatam, faculdades se dizem rendidas ao não ter como responder sobre como será o procedimento em 2021.
Faculdades e universidades interessadas em abrir as portas ou ampliar cursos têm ido com parlamentares ao encontro de Milton Ribeiro. Em 11 de novembro, Pastor Eurico (Patriotas-PE) encontrou o ministro com pessoas que pretendem abrir uma faculdade.
Por último, pedem que a educação seja transforma numa atividade essencial atividade essencial para poderem continuar funcionando.
“Por que levamos para o MEC? Porque precisamos do apoio dele para convencer o governo que essa reforma tributária é péssima para o setor, que desonera o governo em R$ 225 bilhões”, diz Sólon Caldas, que esteve com o ministro em 28 de agosto.
INSTITUIÇÕES RELIGIOSAS
Foram basicamente 2 motivos que levaram ao aumento dos encontros com representantes. A origem de pastor do ministro e o fato de que aquelas que, além de confessionais, são filantrópicas, terão aumento na tributação com a reforma tributária. Hoje, as filantrópicas não pagam PIS e Cofins.
“Com a reforma, terão de pagar 12%”, diz Sólon Caldas.
Para o ex-ministro da Educação Cristovam Buarque, Milton Ribeiro tem comportamento corporativo ao dedicar 20% da sua agenda de encontros a universidades confessionais.
“Acho que é corporativismo de receber a sua turma. Você não é ministro para continuar seu doutorado”, disse ao referir-se à tese de Ribeiro, que aborda o calvinismo na educação brasileira.
INSTITUIÇÕES PÚBLICAS
Por outro lado, o presidente do Conif (Conselho Nacional das Instituições da Rede Federal de Educação Profissional, Científica e Tecnológica), Jadir Pela, disse que não tem conseguido agenda com o ministro. Entre as pautas estaria entender o plano do governo sobre a educação profissional, Orçamento e nomeação de reitores.
Jadir explicou que quando o ministro assumiu houve uma reunião virtual. Naquele momento, foi solicitada uma agenda presencial, mas ainda não obteve retorno.
“Falou na conversa inicial que seria o ministro do diálogo, mas isso não tem acontecido. A impressão é de que as instituições públicas não são prioridade. Estamos jogados à própria sorte”, disse.
O ex-ministro Ricardo Vélez Rodriguez, que teve a maior parte das suas agendas com representantes do ensino privado, contou ao Poder360 que tinha como meta alterar a forma como os reitores são escolhidos nas instituições públicas. Atualmente, a escolha é resultado de uma lista tríplice de funcionários da entidade. Ele queria adotar modelo semelhante ao do ITA, que faz chamada pública para o cargo.
“Procurei os reitores e parlamentares. Foram bastante receptivos. Minha ideia era que as universidades públicas fizessem parte e melhorassem os locais onde estão instaladas. Houve simpatia. Mas pelo jeito o processo parou“, contou ao Poder360.
O MEC foi procurado com mais de 24 horas de antecedência à publicação destas informações para dizer o que a pasta pretende fazer a respeito dos pedidos das entidades privadas. O Poder360 não recebeu resposta.
*Por: Guilherme Waltenberg / PODER360