Entidade destaca seis pilares necessários para estruturar esse processo, como maior controle de plataformas irregulares e monitoramento de atividades ilícitas. Com divulgação do Sincomercio São Carlos
SÃO PAULO/SP - Em meio a um cenário de preocupação crescente com os efeitos causados pelas plataformas de apostas esportivas, como endividamento, dependência psicológica e operações fraudulentas e criminosas, o governo deu um passo importante ao antecipar para outubro a suspensão de plataformas de apostas online que não estiverem devidamente autorizadas para operar no Brasil. A medida (Portaria SPA-MF 1.475/2024, do Ministério da Fazenda) chega no desenrolar do processo mais amplo de regulamentação das chamadas bets, iniciado há alguns meses. A divulgação é do Sindicato do Comércio Varejista de São Carlos e Região (Sincomercio São Carlos).
Segundo a Federação do Comércio de Bens, Serviços e Turismo do Estado de São Paulo (FecomercioSP), porém, se todas essas normas estão levando, de fato, as apostas a um ambiente mais controlado, os riscos inerentes ao comportamento das pessoas, nessas plataformas, permanecem altos — principalmente por causa da facilidade e da disponibilidade de acesso aos sites.
É por isso que, na visão da Entidade, o processo regulatório em curso deve focar em seis pilares fundamentais.
O primeiro deles é o controle rigoroso das plataformas irregulares, proibindo-as de qualquer tipo de operação no País até que se registrem no Ministério da Fazenda. Isso garantirá que apenas as empesas devidamente regularizadas possam operar, criando um ambiente mais controlado e seguro.
Além disso, a regulamentação deve conter dispositivos que ajudem o Poder Público a investigar, monitorar e punir a utilização dos sites de apostas para atividades ilícitas, como lavagem de dinheiro e financiamento do crime organizado. Uma vez que as regras estejam em vigor, será mais fácil rastrear transações suspeitas e observar padrões duvidosos.
Em terceiro lugar, a regulamentação terá de cumprir o papel vital de proibir o acesso de perfis específicos — protegendo pessoas mais vulneráveis às apostas, como menores de 18 anos ou indivíduos já diagnosticados com ludopatia —, bem como de empresários e sujeitos com informações privilegiadas sobre jogos disponíveis, que podem gerar conflitos graves de interesse.
A FecomercioSP ressalta que um dos pontos mais relevantes é a criação de mecanismos de prevenção ao vício e ao endividamento. Medidas como limites de apostas, bloqueio programado de acesso aos sites e monitoramento de comportamentos de risco ajudam a evitar que os usuários percam o controle das finanças e desenvolvam dependência.
Uma pesquisa de autoria da Entidade, publicada no fim de agosto, apontou que 20% dos que apostam online na capital paulista usariam recursos despendidos nos jogos para pagar contas domésticas. Outros 12% comprariam comida com esse dinheiro.
Por isso, é fundamental que a regulamentação estabeleça limites de apostas, bloqueios programados de acesso às plataformas em horários mais críticos (procedimento já realizado por alguns países) e crie meios de monitorar comportamentos de risco e de suspender perfis de indivíduos com alto risco de dependência.
A elaboração de meios de tornar os jogos mais transparentes, como a obrigatoriedade de divulgação das taxas de retorno de cada aposta, e um arcabouço rígido de regras responsáveis em torno da publicidade são os outros dois pilares que a FecomercioSP entende serem essenciais para regular o setor.
‘INVESTINDO’ COM APOSTA
O estudo ainda mostrou que, entre os paulistanos que apostam com frequência, um quarto (25%) o faz porque quer aumentar os rendimentos domésticos de forma mais rápida. Outros 9% ainda afirmam que os jogos representam um meio de investimento.
Diante disso, a FecomercioSP alerta para o fato de que muitos brasileiros veem as apostas como uma forma alternativa de poupar, refletindo um problema estrutural de orçamento familiar. Além da insegurança financeira, isso é especialmente grave porque, pelos dados, a rotina de um apostador é marcada mais por perdas (44% dos entrevistados disseram que essa é sua rotina de resultados) do que ganhos (30%). Outros 26% dizem nem ganhar, nem perder.
Os recursos utilizados para apostar variam, com 52% das pessoas usando não mais do que R$ 50 por mês nesses jogos. No entanto, praticamente um quarto (19%) deixa pelo menos R$ 100 nas bets mensalmente.
Esses impactos são corroborados por levantamento realizado pelo banco Itaú. Segundo a instituição, considerando montantes totais gastos nas empresas de apostas — ou seja, taxas e valores efetivamente apostados, sem considerar premiações pagas —, a soma que esses negócios movimentaram no último ano chega a R$ 68,2 bilhões (ou cerca de 0,6% do PIB brasileiro). Desse montante, R$ 44,3 bilhões voltaram aos usuários em formato de premiações, o que significa, portanto, que aproximadamente 36% desse dinheiro ficaram com as bets.
REGULAÇÃO
No fim do prazo estipulado pelo Ministério da Fazenda para iniciar o processo regulatório, um total de 113 empresas de apostas se cadastrou no processo, que está a cargo da Secretaria de Prêmios e Apostas (SPA) da pasta. A estimativa do governo é de arrecadar até R$ 12 bilhões por ano com a regulamentação das apostas online, dos quais em torno de R$ 4 bilhões seriam provenientes de outorgas para autorização e funcionamento.
As diretrizes estipuladas, que abrangem “regras de jogo responsável”, tentam criar um ambiente de práticas seguras e de publicidade adequada. Dentre os objetivos do processo, destacam-se prevenção da dependência e dos transtornos patológicos associados e impedimento do consumo do serviço por menores e pessoas vulneráveis ou que gerem conflitos de interesse.
A FecomercioSP, que reforça a preocupação com os impactos socioeconômicos e psicológicos das apostas esportivas, seguirá trabalhando para que esse cenário controlado, seguro e equilibrado das bets buscado pela regulamentação se torne norma o mais rápido possível.