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O tribunal especial da Ucrânia à custa da assistência internacional VYACHESLAV MADIYEVSKYI / ZUMA PRESS / CONTACTOPHOT

O tribunal especial da Ucrânia à custa da assistência internacional

Escrito por  Dez 03, 2022

UCRÂNIA - O governo ucraniano redobrou nos últimos dias os seus apelos para um tribunal especial cuja principal tarefa seria julgar crimes cometidos com a Rússia, uma tarefa ambiciosa para a qual Kiev procura a ajuda dos seus principais aliados internacionais, enquanto se aguarda a definição de onde e como os julgamentos hipotéticos poderiam ser realizados.

O artigo 125 da Constituição da Ucrânia estabelece explicitamente que "não é permitido o estabelecimento de tribunais extraordinários e especiais", um legado do contexto pós-soviético em que se temia um sistema de justiça à la carte como na URSS.

No entanto, o presidente ucraniano, Volodimir Zelenski, não hesita em apelar a um "tribunal especial" para julgar "todos os responsáveis por esta guerra criminosa", como salientou esta semana durante um discurso à nação em que apelou à cooperação de outros países europeus.

Os peritos não consideram esta exigência incompatível com o direito ucraniano, desde que o conceito de "internacional" seja acrescentado ao tribunal que Zelenski exige, de modo que, mesmo que pudesse ser constituído na Ucrânia, o faria dentro de um quadro fora do próprio sistema judicial ucraniano, nota o portal Just Security.

Zelenski recebeu um apoio chave da Presidente da Comissão Europeia Ursula Von der Leyen, que ao estabelecer uma série de medidas propôs a criação de um tribunal tão especial para que "os crimes horríveis da Rússia não fiquem impunes" e o regime de Vladimir Putin "pague" por eles.

Neste contexto, Bruxelas propõe que, "embora continuando a apoiar o Tribunal Penal Internacional", sejam feitos progressos no sentido da criação de um "tribunal especializado" apoiado pelas Nações Unidas para "investigar e julgar o crime de agressão da Rússia".

É precisamente neste crime de agressão que Zelenski também se concentra, consciente de que não é possível destacar Moscou para o início do próprio conflito sob a égide do TPI, um tribunal com o qual, no entanto, ele quer continuar a colaborar.

O Estatuto de Roma, que moldou o TPI, prevê a agressão como crime a ser processado, mas a sua definição não foi aprovada por todas as partes, o que a impede de exercer jurisdição sobre ela. Só seria possível se o país de origem do alegado agressor, neste caso a Rússia, aceitasse a jurisdição do tribunal.

O Gabinete do Procurador da República das TIC lançou a sua própria investigação sobre possíveis crimes de guerra e crimes contra a humanidade, e Kiev tem promovido ativamente estas investigações. Não surpreendentemente, o governo ucraniano já decidiu submeter-se à jurisdição do tribunal de Haia em 2014, quando o conflito eclodiu no leste do país e a Rússia absorveu a península da Crimeia.

Um hipotético julgamento de Putin por crimes que recaem sob a jurisdição do TPI está longe de estar concluído, em qualquer caso, uma vez que dependeria de, no caso de ser acusado de crimes de guerra ou de crimes contra a humanidade e de ter um mandado de captura pendente, viajar para um país que coopera com a Haia, onde poderia ser detido.

 

O PAPEL DA ONU

Fontes da UE reconhecem que, para que as reivindicações de Von der Leyen sejam satisfeitas, o tribunal necessitará do "apoio político, financeiro e administrativo" das Nações Unidas, uma organização que, por outro lado, tem uma mão atada atrás das costas devido ao poder de veto da Rússia no Conselho de Segurança, o principal órgão executivo.

Seria possível questionar o Secretário-Geral da ONU António Guterres e procurar legitimação na Assembleia Geral, onde todos os Estados membros estão representados e nenhum país tem o direito de veto. Nos últimos meses, a Ucrânia já obteve vários apoios diplomáticos sob a forma de resoluções na Assembleia.

O escritório de Guterres, por enquanto, prefere permanecer à margem. "Qualquer decisão para estabelecer este tribunal, com ou sem o envolvimento da ONU, cabe aos estados membros", disse o porta-voz principal Stéphane Dujarric numa conferência de imprensa esta semana.

O ICC também evita entrar no debate e um porta-voz consultado pela Europa Press afirmou que o órgão "está concentrado no cumprimento do seu próprio mandato". Contudo, acrescentou: "Saudamos qualquer esforço que traga mais justiça às vítimas, onde quer que seja.

A ONU já tem um precedente na criação de tribunais especiais, tal como o exigido pela Serra Leoa em 2000, com um pedido direto ao Secretário-Geral na altura, Kofi Annan, que levou a uma resolução do Conselho de Segurança que apelava a negociações para a criação deste mecanismo.

Três anos antes, o Camboja também pediu ajuda à ONU para julgar os líderes dos Khmers Vermelhos. Neste caso, a colaboração levou à criação de um tribunal cambojano com participação estrangeira e normas internacionais.

 

INÍCIO DOS CONTATOS

O governo ucraniano redobrou a sua ronda de contatos internacionais em busca do tribunal que procura, com reuniões nos principais países europeus e também em Washington. À frente deste grupo está Andriy Yermak, uma figura chave na presidência e um dos conselheiros de maior confiança de Zelenski.

O Ministro dos Negócios Estrangeiros Dimitro Kuleba também levou a questão a reuniões da OTAN e da Organização para a Segurança e Cooperação na Europa (OSCE), das quais a Rússia continua a ser membro.

O governo francês, que já se declarou a favor da iniciativa e confirmou contatos com outros parceiros, espera "obter o mais amplo consenso possível no seio da comunidade internacional" no caso da Ucrânia, embora pareça claro que já foram estabelecidas posições.

As sucessivas resoluções da ONU nos últimos meses deixaram claro quais os aliados que a Rússia tem, quer através de apoio explícito, quer através de equidistância como a adoptada pela China, outro dos cinco países com poder de veto no Conselho de Segurança.

Moscou deixa claro que não respeitará qualquer tribunal "ad hoc" criado para rever o que continua a definir como uma "operação especial", que continua a justificar com base em alegados riscos de segurança nacional. Tais esforços "não terão legitimidade, não os aceitaremos e condenamo-los", disse na quinta-feira o porta-voz do Kremlin, Dmitry Peskov.

 

 

por Pedro Santos / NEWS 360

Redação

 Jornalista/Radialista

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