SÃO CARLOS/SP - No artigo desta semana, abordo um assunto que ainda é um Projeto de Lei e como é de se esperar, em nosso país tudo o que pode trazer benefício ao consumidor e “tirar as grandes indústrias da zona de conforto”, acaba gerando polêmica.
Trata-se do projeto que visa permitir a importação de carros seminovos e usados. Na regra atual, é terminantemente proibido importar veículos usados no Brasil, com exceção aos modelos acima dos 30 anos, conforme estipula a Portaria nº 18 do antigo Departamento de Comércio Exterior (Decex), válida desde 13 de maio de 1991.
Bom, pelo ano da portaria já podemos inclusive presumir que muito se mudou com o passar dos anos e nosso país não é o mesmo do ano de 1991, ao contrário, em muito evoluímos, assim como o resto do mundo. Ao meu ver, a proibição realmente precisa ser revista e revogada, pois é retrógrada e prejudicial ao consumidor.
É exatamente isto que Projeto de Lei 237/2020 prevê. Caso ele seja aprovado chegará ao fim as restrições impostas há exatamente 30 anos.
O objetivo do projeto é justamente abrir uma nova opção de compra ao consumidor brasileiro. Quanto maior a concorrência, maiores são as chances dos veículos abaixarem os preços, tanto para os importados quanto para os nacionais. É a lei da oferta e da procura!
A importação de veículos usados já ocorre em países vizinhos. Cito o Paraguai e Argentina, ocasião onde encontramos carros usados importados e mais tecnológicos que os brasileiros com o preço menor dos quais temos em nosso país.
Infelizmente vemos por trás a contrariedade mesmo que obscura das grandes montadoras e explicita do Sindicato Nacional da Indústria de Componentes para Veículos Automotores (Sindipeças), que alegam que a Proposta de Lei não é tão favorável ao consumidor quanto parece, já que não oferece a garantia de assistência e manutenção pós-venda e que nosso combustível com 25% de etanol misturado na gasolina não poderá ser usado nos motores dos carros importados.
Com todo respeito que tenho ao entendimento acima, o consumidor que deseja comprar um veículo importado usado não pode continuar a sofrer os embargos de três décadas, com a simples argumentação da falta de garantia e de que nossa gasolina “não é pura”.
Nos dias atuais vemos os altos valores e a crescente falta de veículos novos para a venda. As montadoras nacionais deixam os consumidores a mercê e nem mesmo peças de reposição andam disponibilizando para reparo dos veículos, mesmo existindo lei que as obrigue (Lei 8078/90 – CDC).
É evidente que se aprovado o projeto de lei, novas regras deverão ser impostas e os órgãos públicos terão que se adaptarem para verificar se o veículo importado atende ou não aos requisitos exigidos pelas normas brasileiras.
É fato que a indústria brasileira demorou anos para implantar itens de segurança básicos nos carros brasileiros como, por exemplo, o airbag, então dificilmente os carros usados importados não atenderão aos requisitos mínimos exigidos pelo Brasil.
Outro ponto que destaco é que existem muitos carros com mais de 10 anos de uso em circulação no exterior, com níveis de equipamentos e segurança superiores àqueles feitos atualmente no Brasil e é injusto privar o consumidor brasileiro de desfrutar do conforto e benefícios disponibilizados em tais veículos que custarão menos e oferecerão mais.
Para a implantação, o Projeto de Lei ainda precisa de aprovação na Comissão de Viação e Transportes para ter continuidade na Câmara dos Deputados, que inclui mais duas comissões e, posteriormente, no Senado. Depois das etapas iniciais, o texto é enviado para a sanção presidencial.
Finalizando, tenho comigo que se aprovado o projeto, todos seremos beneficiados, o mercado brasileiro terá que se adaptar e rever os preços ofertados ao consumidor, que com a pandemia e a escassez de componentes, sofrem nas mãos das grandes indústrias e, atualmente, pagam por veículos usados valores de carros 0km, sendo que estes últimos até mesmo pararam de ser fabricados.
Por hoje é só, use álcool em gel e máscara, siga as recomendações médicas e sanitárias. Até a próxima!
*Dr. Joner Nery é advogado inscrito na OAB/SP sob o n° 263.064, pós-graduado em Direito e Processo do Trabalho e Especialista em Direito do Consumidor, ex-diretor do Procon São Carlos/SP e ex-representante dos Procons da Região Central do Estado de São Paulo, membro da Comissão Permanente de Defesa do Consumidor da OAB/SP.